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Direto dos anos 80, fitas K7 estão voltando ao mercado brasileiro

17 de agosto de 2016, por Lucas Vieira
Música

Na abertura de Guardiões da Galáxia (2014), o “herói” Senhor das Estrelas desce em um planeta abandonado na sua nave. Após escanear a área, o explorador desativa seu capacete e saca um aparelho que não parece fazer parte de seu universo: um genuíno Walkman, direto dos anos 80. Apesar de (ainda) não termos guaxinins armados e árvores guerreiras, em breve, teremos de volta no Brasil uma das tecnologias da gangue espacial: as fitas cassete.

Criado pela Phillips em 1963, o formato chegou ao mercado oferecendo portabilidade em relação aos discos de vinil. Com um terço da altura dos LPs (as fitas medem 10 cm), era possível carregar os K7 com muita facilidade. Porém, a novidade perdia na qualidade de som e, no início, em tempo de duração. As fitas cassete criaram uma verdadeira revolução. Quando chegaram ao mercado os aparelhos com gravadores, foi possível registrar programas de rádio, copiar LPs (começando uma fase expansiva da pirataria) e criar coletâneas com músicas selecionadas, algo muito legal na época, principalmente para fazer presentes.

Fita K7

João Clemente ainda guarda algumas de suas fitas com carinho. Na foto, estão bandas brasileiras, americanas, italianas e argentinas (Foto: Arquivo Pessoal)

Os K7 também possibilitaram que bandas independentes registrassem suas demos com facilidade e surgissem gravações não oficiais (os famosos bootlegs). João Clemente, músico nas bandas NeesEes e Guermantes, que ainda mantém parte de sua coleção de fitas, relata: “Os grupos gravavam os cassetes e distribuíam ou vendiam nos shows. Outro lance legal eram as ‘distros’, distribuidoras que vendiam por catálogo. Você enviava o pedido por correio com o dinheiro enrolado em carbono e eles mandavam a fita, tudo meio que às cegas”.

Walkman da Sony

O Walkman, da Sony foi febre mundial e ajudou na popularização das fitas. No total, foram mais de 200 milhões de unidades vendidas. (Foto: Reprodução)

O auge do K7 foi entre as décadas de 1980 e 1990. Isso se deve a uma invenção genial da empresa Sony: o Walkman. Pouco maior que as próprias cassetes, o aparelho, lançado em julho de 1979, era alimentado normalmente por pilhas e possibilitava ouvir as fitas no fone de ouvido em qualquer lugar.

A Sony encerrou a produção do Walkman em 2010. Mesmo com o fim do tocador mais famoso da história, existe quem invista no formato. É o caso do selo paulista Contra Boots, que desde 2015 trabalha com fitas de uma forma artesanal. “Nós não as fabricamos, compramos de um distribuidor e fazemos a gravação. Geralmente falamos com as bandas com antecedência. Se nos autorizam, vamos ao show munidos de material de gravação. Gravamos o som direto da mesa e com um gravador portátil captamos o som ambiente. Depois mixamos ou entregamos a alguém que faça esse processo. Fazemos também a arte e toda a produção gráfica. Aí gravamos uma master em fita cromo [a original que vai ser copiada] e depois duplicamos numa máquina”.

Esse ano, a Flap C4, gravadora de São Paulo, resolveu investir nos K7 e, em breve, eles voltarão em massa às prateleiras brasileiras. Em um vídeo, postado em fevereiro, a empresa divulgou a compra de uma copiadora que produz 100 fitas por hora.

Fernando Lauletta, um dos sócios, explica porque voltou a fabricar as fitas no país: “É uma tendência mundial, as pessoas estão querendo conhecer essa nova velha maneira de ouvir música fora do computador ou do celular, sem o apoio visual de um clipe, simplesmente ouvir. Já dá para sentir essa tendência de uma forma mais forte no mercado de vinil, e o cassete pode ser considerado uma opção interessante e com preço mais em conta”.

Segundo Fernando, o público é “qualquer artista que queira duplicar seu trabalho em cassete”, porém, acredita que não são os mais famosos que irão buscar os K7: “A gente busca atender ao mercado em geral. É claro que a maior parte de quem busca esse tipo de formato não é quem está na grande mídia, mas quem sabe para que lado as coisas vão andar…”.

A vantagem das fitas sobre o vinil será a mesma de décadas atrás: preço e portabilidade. A Flap C4 diz que o custo das cópias será de R$15 e que devem chegar ao público por preço médio de R$25. Apesar de as máquinas já estarem prontas para trabalhar, as fitas ainda demoram um pouquinho a chegar ao mercado. Fernando comenta que ainda falta a matéria prima – que está vindo dos EUA – chegar ao Brasil, mas acredita que esse processo já está na reta final.


(Em fevereiro a Flap C4 divulgou esse vídeo mostrando sua nova copiadora de K7 em ação)

Se as fitas vão emplacar no país ainda é incerto. Assíduo colecionador de música, Raphael Fernandes, músico e editor da Editora Draco comenta que, apesar de um entusiasmo inicial, não tem o mesmo fervor com K7 que tem com LPs: “Voltei a comprar fitas recentemente. Comprei um walkman Aiwa (sonho de infância) e depois adquiri três fitas: Ratos de Porão – EnBsAs, Muzzarelas – Pig Mouth Strikes Again e Renegades of Punk – Ao vivo. Não pretendo colecionar com o mesmo fervor dos LPs, mas se encontrar algo legal como esses bootlegs, vou levar.

Fiquei muito tempo sem ouvir, mas quando voltei a comprar fui surpreendido por uma qualidade melhor do que era na minha memória. No entanto, é um formato que considero morto e que deve ser consumido meio que na zoeira. Ele perde fácil para a qualidade do LP e dos bons arquivos digitais. Por outro lado, é como voltar no tempo para quem viveu a época forte do K7”.

K7

Clássicas fitas cassete (Foto: Reprodução)

Lais Melo, vendedora em uma livraria que trabalha também com LPs, tem boas lembranças do formato, mas acha que essa volta é por puro saudosismo: “Tenho muitas lembranças dos K7, especialmente porque foram as precursoras das playlists. Ouvir música colada ao aparelho, gravando suas canções favoritas, era uma experiência e tanto. Sem falar nas vezes em que ela enrolava, arrebentava e outras emoções mais. Conseguir transições perfeitas era uma obsessão, gravar três segundos de silêncio era obrigatório”, afirma.

“Como peguei as fitas em meados dos anos 90, não era possível colecionar. Quase não tenho lembranças de fitas dos artistas que me interessavam. O interesse por formatos antigos tem crescido muito. Hoje em dia o mercado de vinil já é uma realidade, há público, uma produção nacional consistente, mas ainda assim restrita a apreciadores do formato. Acho que esse ensaio da volta das fitas k-7 é mais um saudosismo, porque como formato não temos muitos motivos para sentir saudades”, completa.

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5 Responses

  1. Luciano Araujo

    Curti demais a matéria sobre as fitas K7! Possa ser que esse tímido retorno (por enquanto) desta, se mantenha sob o nível do retorno do discos de vinil, o popular LP. Que mesmo contando com essa ascensão e valores característicos reconquistados, ambos artigos serão procurados e adquiridos ainda em pequena escala enfim; aos fiéis amantes dos formatos analógico.
    No meu caso, aos 40 anos de idade e envolvido com música desde a minha infância, afirmo que vivi momentos gloriosos de prazer em escutar música nesses formatos anciões e mesmo conferindo o nascimento de novas formas de reprodução, afirmo com toda legitimidade que esses veículos atuais da modernidade deixam muito à desejar no termo qualidade no que se refere aos métodos primordiais, perdendo tb no termo romântico da coisa, do contato e da noção da arte reproduzida… Bom, artefatos evidentes d’uma era em que o termo MUSICA era levado à sério.
    Depois de todas essas declarações me assumo um apaixonado nato dos Lp’s e das fitas K7, e o que possuía daquela fase de minha vida me acompanha até os dias de hoje. O acervo cresce à cada instante! rss.

    1. Lucas Vieira

      Oi, Luciano. Tudo bem?

      O mercado de K7 (incluindo tocadores) acho que ainda é bem menor. Não acredito muito que vai esbarrar no vinil, inclusive porque as fitas não tem a mesma qualidade de som.

      Escutar formatos analógicos é realmente um prazer. Tem todo um ritual, um romantismo. A cada dia mais mergulho nessa comprando e cuidando dos meus vinis! Concordo com essa questão da qualidade do som uma vez que, por exemplo, você ouça um disco em perfeito estado em um equipamento de ponta também funcionando perfeitamente. Gosto muito de ouvir músicas no Spotify, pois quando você escolhe a opção qualidade extrema o som fica bem limpo, não é como alguns MP3s que baixávamos há alguns anos.

      Um abraço de outro apaixonado pelos formatos analógicos!!!

  2. Carlos Alberto H Brandão

    Olá, boa tarde

    Ainda hoje tenho todo o meu acervo de vinis e fitas cassete, e mesmo, algumas fitas de rolo, de uma época anterior aos cassetes. O glamour e o ritual de se ouvir analógico é inigualável. Discordo um pouco no que se refere à qualidade sonora da fita: depende de onde ela é gravada e reproduzida. Se vc utilizar um tape deck de qualidade como um Revox, Nakamichi, Denon, Akai a conversa é outra.
    Mas independentemente de qualquer coisa, o que importa é que este retorno perdure, mesmo que seja para um público reduzidíssimo.

    1. Lucas Vieira

      Olá, Carlos Alberto. Tudo bem?

      A nostalgia e todo esse ritual de colecionar e ouvir formatos antigos é realmente única. Tenho que concordar que um equipamento de qualidade sempre vai fazer toda a diferença não hora de curtir um som, independente se estamos falando de LP, K7 ou MP3. Acredito também que estamos falando de um mercado muito pequeno, mas tomara que perdure!

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