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Empreendedorismo retrô: Os desafios enfrentados pelas mulheres que investem no mercado da nostalgia

7 de março de 2017, por Daise Alves
Lifestyle
Mahara Albertoni

Empreendedorismo, criatividade e inovação andam juntos, mas sabemos que empreender no Brasil não é uma tarefa fácil. Impostos, burocracias, linhas de crédito; essas e outras questões acabam dificultando a vida daqueles que querem abrir um negócio por aqui. E quando o assunto é empreendedorismo retrô, a questão fica ainda mais complicada, já que trata-se de um mercado nichado e com pouco espaço para aquelas que querem investir.

Mas, algumas mulheres, com muita força de vontade e determinação, resolveram arriscar e têm conquistado seu lugar no setor. Para esse Dia Internacional da Mulher, resolvemos conversar com 9 mulheres para descobrir quais são os desafios enfrentados por elas desde que resolveram investir no mercado da nostalgia.

Lojas de roupas, salões de beleza, fotografia, agência de design, bar… são diversos os segmentos dessas, que resolveram unir o útil ao agradável, como suas paixões pela cultura retrô a uma profissão lucrativa. Confira:

Karine Almeida, proprietária da loja de roupas Rocket Clothing, localizada em Curitiba – Paraná

Segmento: Loja de Roupas Retrô

Karine Almeida

Karine Almeida, usando roupa da Rocket Clothing, confeccionada por ela mesma (Foto: Arquivo Pessoal)

“Sou formada em estilismo, e tudo na Rocket Clothing sou eu quem faço; desde a criação das camisas, dos bordados até o design gráfico. Uma das maiores dificuldades que eu acho é a matéria prima que existe no mercado, como estampas e tipos de tecido. Mesmo a Rocket sendo uma marca retrô, eu tento criar modelos únicos, exclusivos e com a cara do meu cliente.

Outra dificuldade é a cópia. Por trás de cada peça tem muita pesquisa, noites não dormidas e trabalho duro. Quando alguém copia o meu trabalho é como se tivesse roubado um filho meu. Ser empreendedor no Brasil é muito complicado, escolher o mercado retrô torna ainda mais difícil por ser um público pequeno e sobreviver financeiramente dele é quase impossível. Quem escolhe o universo retrô como forma de ganhar a vida, escolhe por amor.

As pessoas também acham que o que eu faço não é trabalho, como se eu fosse uma dona de casa brincando de costurar. Confesso que isso às vezes me desmotiva, mas quando meu cliente fica satisfeito e eu vejo os comentários do meu trabalho me dá uma super força!”

Mahara Albertoni, especialista em penteados vintage, há 10 anos investe no mercado da beleza

Segmento: Salão de Beleza

Mahara Albertoni

Mahara Albertoni, proprietária de um Salão de Beleza e especialista em penteados vintage (Foto: Liliane Gaspar)

“É difícil para mim falar sobre empreender no mercado retrô, pois, no meu caso, as coisas aconteceram de forma natural. Gosto de Rockabilly há muito tempo, e com o estilo musical veio também algumas influências na maneira como me visto e como enxergo a estética das coisas. Quando abri meu primeiro salão, o Vintage, em 2008, era natural para mim que já tivesse inspirações retrô em sua decoração, pois era o que eu achava bonito. Me especializar e me direcionar para as décadas de 40 e 50 foi tão natural, pois, conforme ia construindo minha carreira profissional e aprendendo técnicas novas, sempre tentava aplicá-las para a estética que tanto admirava.

Em dezembro deste ano, completo 10 anos de carreira, o que posso dizer é que, sim, invisto e pesquiso cada vez mais neste mundo que me encanta tanto, porém o mercado brasileiro não possui uma demanda tão grande de pessoas que consomem este estilo a ponto de focarmos um salão de beleza só para o mundo vintage. Hoje, o estúdio Mahara Alberttoni atende todos os serviços de cabelo e maquiagem. É para a mulher que ama o estilo vintage e quer algo fiel à época, mas também para a pessoa que apenas simpatiza com a decoração e tem um visual mais moderninho, ou para a garota que quer apenas uma referência no corte da franja Bettie Page, por exemplo.

Acredito que um Hair Design precisa saber do todo da sua área de especialidade, todas as técnicas modernas e antigas que estão à sua disposição, e precisa, acima de tudo, ter referências e inspirações. O que faz de você um bom profissional é a forma que você lê o seu cliente e aplica seu conhecimento conforme a sua necessidade”.

Deia Marinho, publicitária e co-fundadora do Bizarro Brechó em São Paulo

Segmento: Brechó Online

Bizarro Brechó

Deia Marinho, proprietária do Bizarro Brechó (Foto: Reprodução)

“Eu e minha sócia e amiga Isabela Santos resolvemos garimpar peças, inicialmente, para uso pessoal. O insight de abrir o Bizarro veio com a incerteza em nosso mercado de trabalho (sou publicitária e a Isa é ilustradora) e com a vontade de nos dedicarmos a levar a felicidade às clientes, adicionando em suas vidas peças maravilhosas, que, dificilmente, seriam encontradas em lojas fast fashion, por exemplo, espalhadas por aí.

Ainda mantemos trabalhos paralelos para conseguirmos arcar com as despesas e essa é a grande dificuldade: conciliar nossa dedicação à moda (que amamos) aos nossos trabalhos. Às vezes é exaustivo, mas buscamos manter a harmonia e a paz em nossas vidas, sem pressão e continuar difundindo a ideia do slow fashion para um mundo melhor, menos acelerado e que produza menos resíduos.

A dificuldade de ser mulher no mercado publicitário é bem mais evidente. Para começar a maioria dos chefes são homens, tem muito assédio e a diferença salarial é gritante. E, na verdade, esse é outro ponto para a gente ter iniciado o brechó.”

Daniela Petrucci, comissária de bordo viajando o mundo, também se dedica à fotografia

Segmento: Fotografia Vintage

daniela-petrucci

Daniela Petrucci, fotógrafa vintage (Foto: Divulgação)

“Trabalhar com fotografia inspirada em épocas passadas é delicioso, e minhas clientes chegam para uma sessão de fotos totalmente ansiosas e felizes por saberem que irão se vestir e se portar como as belas mulheres de antigamente. Porém, apesar deste mercado de fotografia ser tão contagiante e crescer cada vez mais, alguns fatores em relação a este tipo de fotografia não contribuem muito para facilitar a vida de uma pesquisadora e amante do Vintage ou retrô, como eu.

Um primeiro exemplo é em relação aos aluguéis de roupas e locações de móveis e objetos, itens que muitas vezes são necessários para compor um belo cenário. Muitas coisas são acessíveis em relação à oferta que existe em uma cidade metropolitana como São Paulo, por exemplo, porém em outras cidades do Brasil a procura se torna cada vez mais difícil. Os valores destes itens nem sempre são muito acessíveis, o fotógrafo precisa “rebolar” no orçamento sabiamente para conseguir fazer belas e diferentes composições em cada trabalho, principalmente no caso de orçamento para particulares e não para empresas.

A conservação do acervo Vintage é algo que também dificulta na hora de alugar ou adquirir itens, pois temos que lidar com os resquícios do tempo, que cada vez se tornará mais passado do que hoje. Outro exemplo é em relação aos cenários. Muitas vezes fotografo com motos, carros e até aviões, mas a maior dificuldade nestes casos é em relação ao lugar em que tudo acontecerá. Encontrar uma locação para fotografar que tenha um cenário o mais neutro ou vintage possível é uma das mais difíceis tarefas.

Por esses e outros motivos, a fotografia Vintage – aquela de arrancar bons suspiros -, em que a pose da modelo está perfeitamente dirigida, com roupas que valorizam sua silhueta e que não chamam mais a atenção que ela mesma, em que o cenário foi arduamente pensado e elaborado, assim como a iluminação e composição da cena e modelo, e para finalizar um belo tratamento de imagem que acrescenta a cereja do bolo, não é nada fácil de encontrar no mercado. E para conter todas estas características ideais é necessário muita disposição, trabalho e principalmente um bom e competitivo valor para as clientes terem acesso a esta linda e única experiência. Quem topa o desafio?”

Patrícia Grossi, pós-graduada em moda, proprietária da marca All Right Mama e vocalista da banda Bamboladies

Segmento: Banda de Rockabilly

Patricia Grossi

Patricia Grossi

“O meu universo gira em torno da nostalgia do rockabilly, no qual as mulheres fazem a diferença total e absoluta. Tenho uma marca retrô, All Right Mama by Belanízia, na qual sou sócia com a minha mãe e sou uma das vocalistas de uma banda formada somente por meninas, a Bamboladies. Falando da banda, já ouvimos “elogios” de homens dizendo que a gente tocava bem para uma banda de meninas.

Outra coisa que me chateia é nos rotularem, às vezes, somente como uma banda bonita por termos estilo e sermos do sexo feminino. Eu sinto que as vezes nos julgam assim. Eu ajudo no styling da banda, além do figurino, pois tenho uma marca retrô e sou pós-graduada em moda, mas isso faz parte do visual da banda, pois, além disso, temos talento e somos dedicadas. Tentamos ser o mais profissional possível dentro do meio, executando um bom trabalho, como qualquer banda “normal” formada por homens.”

Ariadne Rodrigues, design gráfico especialista em vintage e proprietária do blog De Volta ao Retrô

Segmento: Design Vintage

Ariadne Rodrigues, designer

Ariadne Rodrigues, designer (Foto: Carol Cardoso)

“Apesar da alta demanda, não é nada fácil ser designer em nosso país. Acredito que as empresas ainda precisam ampliar sua percepção sobre o valor do design para os negócios. Eu decidi trabalhar como autônoma em 2013, mesmo ano em que criei o meu blog, e é através dele que muitos me procuram para prestação de serviços. Mas, ainda que as pessoas gostem do meu trabalho, principalmente quando o tema é retrô, nem sempre estão dispostos a pagar pelo serviço.

Talvez isso aconteça, pelo fato desse nicho de mercado ser novo, e as empresas não terem um orçamento para investir em comunicação, e acaba elas mesmas fazendo o serviço de um profissional. Mas, penso que se essa cultura se tornar cada vez mais popular aqui no Brasil, talvez a demanda por serviços com o tema do passado aumente. Da minha parte, continuarei a estudar e investir cada vez mais nesse tema, vejo futuro. Não tenho enfrentado dificuldades nesse mercado por ser mulher, mas já perdi trabalhos devido a minha cor.”

Francielli Saddock, formada em moda e publicidade, atualmente investe na marca de acessórios Cocktail Crafts

Segmento: Acessórios Retrô

Francielle Saddock

Francielli Saddock com brinco da sua marca Cocktail Crafts (Foto: Reprodução)

“Pouca gente sabe, mas minha primeira formação foi em Moda, me formei em 2009 e meu TCC foi inspirado no College Anos 50. Com o incentivo de algumas pessoas na época até cheguei a fazer algumas vendas pela internet, mas como era muito nova não soube administrar a marca. Fiz Publicidade e Propaganda como segunda formação para justamente me auxiliar nesse sentido e correr atrás do meu sonho como estilista.

Atualmente estou fora do mercado publicitário e na minha marca de acessórios, Cocktail Crafts, encontrei a oportunidade de iniciar um negócio com um custo relativamente baixo para tempos de crise. A marca ainda é nova e está num crescimento bem bacana, mas acredito que a minha dificuldade seja se destacar e criar coisas novas dentro de um universo de tanta reprodução, é difícil criar um produto novo que alguém já não tenha feito e que mesmo assim tenha cara de vintage. Além disso, acredito que a falta de lojas físicas especializadas no estilo limitam as vendas apenas a internet e o alto custo dos Correios fazem algumas pessoas desistirem da compra.”

Lucia Soares, proprietária do Shake Baby Bar, localizado na região da Mooca, em São Paulo

Segmento: Bar Retrô

Lúcia Soares

Lúcia Soares, proprietária do Shake Baby Bar (Foto: Reprodução)

“Há 10 anos, junto com o Eder, meu marido, comandamos o Shake Baby Bar, que pra quem conhece sabe que tem uma pegada retrô, com uma decoração diferenciada com várias peças expostas e talvez seja essa uma das dificuldades: manter a integridade das peças.

De resto, dificuldades normais de quem possui um negócio próprio voltado pra diversão, música, bebidas. Mas, o fato de ser mulher e administrar um bar mais o restante da vida já é um desafio por si só (risos). Mas é um trabalho e faço como tantas outras batalhadoras que trabalham, cuidam de filhos, casa, entre tantas outras coisas, e não faz disso um drama.”

Josy Cats, organizadora do Big River, grande festival dedicado à música dos anos 50 que acontece no Sul do país

Segmento: Evento de rockabilly

Josy Cats

Josy Cats, organizadora do Big River Festival cantando com sua banda Cherry Bomb (Foto: Divulgação)

“Quando eu e meu marido fizemos nossa primeira viagem ao exterior em 2011, em um evento na Inglaterra chamado Hemsby, voltamos com uma imensa vontade de criar um evento similar aos eventos europeus, assim nasceu o Big River Festival – evento este que busca resgatar dentro de nossa realidade toda essa cultura 50’s, a qual amamos tanto. A maior dificuldade de fazer um evento como esse aqui no Brasil é encontrar empresas dispostas a investir em algo no qual não possuem muito conhecimento.

Mas perseveramos a cada edição, buscando todo tipo de apoio e parcerias possíveis. Por acreditar em nosso trabalho prosseguimos e, modéstia parte, muito desta perseverança vem da força e garra da mulher, pois temos esse cuidados nos detalhes dando aquele toque mais que especial só nós mulheres temos! E me orgulho muito em dizer que o lugar de uma mulher, meus caros, é onde ela quiser.”

UNIVERSO RETRÔ NO SPOTIFY

Para entrar no clima dessas mulheres empreendedoras e que nos inspiram, criamos também a playlist Mulheres Inspiradoras em nosso perfil no Spotify. A playlist está cheia de vozes femininas e revolucionárias do jazz, blues e soul, entre elas: Bessie Smith, Billie Holiday, Brenda Lee, Doris Day, entre outras. Aperte o play e ouça:

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4 Responses

  1. Hoss

    Parabéns, meninas! Vocês fizeram uma grande matéria, alias, estão mandando super bem em todas as matérias no mês das mulheres! Mesmo que todos os dias sejam o dia de você, mulheres, é sempre incrível lembrar quantas e quantas mulheres estão arduamente em conjunto a todo esse universo vintage, seja ele envolvendo moda ou ao entretenimento.

  2. Matéria excelente! Inspiradora, porque assim como elas também sou empreendedora retrô e perceber as dificuldades que cada uma enfrenta e empreende mesmo assim porque ama sem perder o foco principalmente, é totalmente motivador. Amei!!

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