O espírito olímpico não acaba quando a chama das Olimpíadas se apaga. Os jogos olímpicos são uma celebração da superação humana, e nada representa tanto esta superação quanto o evento que se segue às Olimpíadas, mas que infelizmente não recebe a mesma atenção, embora merecesse: os Jogos Paralímpicos.
Você já deve saber que as Olimpíadas surgiram na Grécia Antiga. Naquela época, infelizmente, não havia lugar para os deficientes nas cidades-Estado. Em Esparta, onde o culto ao corpo e à força física era importantíssimo, as crianças deficientes eram em geral sacrificadas ao nascer. Por isso os Jogos Paralímpicos são bem mais modernos.
Nem com o renascimento das Olimpíadas em 1896 se pensou em inclusão. Foi só depois de duas grandes guerras que a sociedade passou a enxergar os deficientes de maneira diferente. Os avanços na medicina permitiram que muitos casos antes fatais no campo de batalha e nas cidades bombardeadas conseguissem ser curados, mas deixando grandes cicatrizes e desafios para os sobreviventes.
Foi pensando nos milhões de amputados que voltavam da Segunda Guerra Mundial e precisavam recomeçar a vida com uma dose de autoestima que o neurologista Ludwig Guttmann idealizou, um pouco sem querer, a competição paraolímpica.
Guttmann trabalhava no Centro Nacional de Traumatismos da aldeia inglesa de Stoke Mandeville. Ele decidiu usar esportes diversos para ajudar na recuperação dos soldados, e em 1948 realizou os primeiros Jogos de Cadeirantes e Amputados, com apenas 16 participantes, todos ingleses. Quatro anos depois, competidores holandeses se juntaram a eles e o evento se tornou internacional.
Em 1960 os jogos saíram de Stoke Mandeville e foram realizados em Roma, mesma cidade que sediou as Olimpíadas naquele ano, e abertos a todos os deficientes, e não apenas aos veteranos de guerra. Em 1976 os jogos passaram a receber também amputados e deficientes visuais – antes, só cadeirantes podiam competir. Em 1989 foi criado o Comitê Paralímpico Internacional, que deu maior credibilidade e organização às competições.
Os Jogos Mundiais de Cadeirantes e Amputados (ou IWAS World Games) ainda acontecem anualmente e, a partir de 2005, se tornaram itinerantes, quando ocorreram no Rio de Janeiro.
O termo “paralímpico” se originou da junção de “paraplegia” e “olímpico”. Mesmo com a inclusão de outras deficiências, o nome continuou fazendo sentido, pois o radical grego “para” significa “junto a”, e o evento, de fato, ocorre junto às Olimpíadas.
A expansão dos jogos deu origem a novos desafios. Se antes os atletas usavam diagnósticos médicos para se dividirem em categorias, agora a questão funcional fala mais alto. Isso significa que antes os cadeirantes amputados competiam em uma categoria e os paraplégicos, em outra. Hoje eles já podem competir juntos. Outro desafio é com relação ao conceito de doping nas Paralimpíadas: algumas terapias genéticas e alternativas podem ser consideradas doping pelo Comitê e tirar os atletas da disputa.
Conhecemos e celebramos os recordes dos atletas olímpicos, a exemplo da ginasta Nadia Comaneci, a primeira a tirar nota 10 nas Olimpíadas, ou o nadador Michael Phelps, que recentemente se tornou o maior medalhista olímpico da história. Os recordes destes atletas devem ser celebrados, embora não cheguem nem perto das conquistas dos atletas paralímpicos. A maior medalhista paralímpica, a americana Trischa Zorn, por exemplo, deixa Phelps bem para trás, tendo conquistado 41 medalhas de ouro na natação.
Não é raro que os atletas paralímpicos se qualifiquem e disputem também as Olimpíadas. E houve um caso de um atleta que fez o caminho inverso: o esgrimista húngaro Pál Szekeres ganhou medalha de bronze em 1988 e, após sofrer um acidente de ônibus e ficar paraplégico, se tornou um vitorioso atleta paralímpico.
Hoje os Jogos Paralímpicos contam com 22 modalidades, muitas delas adaptadas e algumas exclusivas, como bocha, futebol de cinco (para deficientes visuais), futebol de sete (para atletas com paralisia cerebral) e goalball. Cada nova edição reúne mais de 1400 atletas de mais de 160 países, numa celebração da inclusão universal e da superação em todos os momentos.