Depois de publicarmos o editorial Memórias de São Paulo, para ressaltar a importância da preservação da história da cidade através da arquitetura urbana e dos pontos turísticos, apresentamos agora uma nova parte do ensaio de inverno clicado por Rodrigo Fleury no centro antigo de São Paulo: Fascinação.
Com o nome inspirado na versão brasileira da valsa “Fascination”, interpretada pela primeira vez em 1943 por Carlos Galhardo (ouça abaixo), o editorial resgata a moda e a atmosfera dos anos 1940 no Brasil. Assim como a cosmopolita capital paulista, onde foi clicado o ensaio, a música é considerada uma “canção do mundo” por conta das diversas traduções.
Para registrar todos esses aspectos da maior metrópole do Brasil e a moda do país na época, optamos por destacar destinos que, durante os anos 1940, eram pontos de encontro da sociedade paulistana, como o Theatro Municipal de São Paulo, o Edifício Banespa, o Prédio dos Correios, o Café Girondino, a Basílica de Nossa Senhora da Assunção e o Mosteiro de São Bento.
A moda da década de 1940
Em boa parte dos países, a década de 40 passou por um momento de tensão com a explosão da Segunda Guerra Mundial em 1939, o que afetou toda a sociedade da época em vários quesitos, inclusive, no vestuário feminino. A escassez de produtos deixou a moda mais racionalizada e o guarda-roupa mais versátil refletiu diretamente no visual das mulheres.
Nessa época, além de encontrarmos roupas com menos tecidos, as pessoas passaram a fazer suas próprias peças e reciclar o que já tinham em casa. A indústria têxtil e as confecções, que antes costumavam importar tecidos e peças de outros países, por conta da crise, começaram a produzir suas próprias versões da moda internacional, iniciando um processo de criação de identidade da moda brasileira.
O próprio centro de São Paulo representou um polo forte para a moda da época. Um exemplo disso, nos anos 1940, é a extinta loja Mappin da Praça Ramos de Azevedo, que antecipou o conceito de Shopping Center, reunindo diversos produtos num mesmo local e se tornando ponto de encontro da elite paulistana. Apesar de muita gente ainda duvidar da qualidade da indústria nacional na época, a falta de recursos iniciou um processo de mudanças de comportamento.
As tendências dos anos 40
Como o período era de guerra, mesmo distante, a tensão dos campos de batalha e o racionamento de recursos refletia também nas peças de roupa, que ficaram mais sóbrias. Desde a qualidade e quantidade dos tecidos utilizados, como as cores aplicadas nas roupas. Podemos dizer que essa não é uma década muito colorida, algo que nitidamente era um reflexo da situação que o mundo passava.
Internacionalmente, as influências do estilo militar, como ombros arredondados e peças retas, são bastante visíveis até o fim da guerra, em 1945. Por conta da escassez de tecidos, ficaram populares também os conjuntos de saia e blusa/blazer no mesmo tecido. No entanto, a realidade do Brasil era um pouco diferente dos países que, de fato, tinham conflitos em seus territórios.
Grande parte das roupas femininas que se popularizaram na época traziam um toque de simplicidade, inspirado nos trajes das camponesas. Fácil de serem copiados, os vestidos e saias dos anos 40 terminavam logo abaixo dos joelhos e podiam ser encontrados em modelos evasê e com pregas – como bem retratamos nas saias que compõem o figurino deste editorial, combinadas a blusas de tricot, que ressaltam a produção artesanal da época.
Os acessórios da década de 1940
O editorial contou ainda com bolsas exclusivas da marca Juliana Lourenço, já conhecida por fazer peças com temática retrô e comercializá-las pela internet há mais de 10 anos. Juliana tomou todo cuidado em produzir bolsas com características que fossem fiéis à época, como a pequena bolsa de mão vermelha e a bolsa com referências bicolor, como os sapatos oxford da década.
Outro destaque no editorial é a meia de nylon, com risca atrás. Naquela época, as mulheres valorizavam muito esse acessório, mas, por conta da recessão, sua fabricação passou a se tornar inviável, já que o material estava sendo usado para outras finalidades durante a guerra, como a produção de paraquedas militares. Assim, muitas mulheres passaram a pintar a famosa risca atrás, para manter o glamour que esse tipo de meia proporcionava. Essa era uma técnica um pouco difícil de fazer em si mesma, então muitas contavam com a ajuda de uma amiga.
Nos pés, optamos pelo oxford de salto e o scarpin, dois sapatos que fizeram sucesso no pós-guerra. O modelo oxford (sem salto) já vinha sendo usado desde a década de 1930, como uma alternativa mais confortável para o cotidiano, e surgiu no final da década de 1940 com uma versão com salto. Já o scarpin representa o início do New Look de Christian Dior, popularizado em 1947, que já trazia um novo conceito de moda para as mulheres da época.
Cabelo e maquiagem dos anos 40
Com a escassez de roupas e produtos cosméticos, os penteados eram bastante enaltecidos nos anos 1940. Os cabelos das mulheres estavam mais longos que dos anos 30 e geralmente eram usados na altura do ombro com penteados diversos. Com a dificuldade em encontrar cabeleireiros, os grampos eram usados para prendê-los e formar cachos e rolinhos.
Para a mulher ainda se sentir na moda, os chapéus não foram deixados de lado, porém passaram a ser produzidos em formatos menores. Mesmo assim, algumas mulheres achavam os preços muito altos em tempos de guerra e passaram a usar outros adereços.
Além de mais baratos, lenços, redes e turbantes, que cobriam mais o cabelo, eram mais seguros para trabalhar no setor fabril, além se ser algo utilizável tanto dentro como fora de casa. Flores também eram bastante utilizadas para arrematar penteados mais sofisticados. Para ilustrar, utilizamos esses adereços em penteados de ambos editoriais: Memórias de São Paulo e Fascinação.
Como é possível ver nas fotos, os anos 40 valorizavam a pele e a maquiagem, de modo geral, mais natural. Um pouco de pó e blush para dar um tom rosado e de saúde nas bochechas; nos olhos, sombra marrom com delineador bem leve e rímel; sobrancelhas mais naturais também, porém no formato mais arqueado; por fim, lábios com tons de vermelhos mais alaranjados. Vale ressaltar que muitas empresas cosméticas da época apenas recarregavam as embalagens de batons, já que o metal estava sendo utilizado na indústria bélica.
Pode-se dizer que os anos 40 foi uma década de muitas privações, porém não deixou de ter seu charme. As dificuldades fizeram com que a moda e a maneira com que as pessoas consumiam se reinventasse; uma bela lição pra se inspirar nesses tempos de crise.
Ficha Técnica
Editorial: Fascinação
Modelos: Daise Alves e Mirella Fonzar
Produção: Universo Retrô
Figurino: Acervo Pessoal
Fotografia: Rodrigo Fleury
Bolsas: Juliana Lourenço
Locação: Centro Histórico de São Paulo
Agradecimentos: Café Girondino
Como site Embaixador do Spotify, para entrar ainda mais no clima da cidade de São Paulo antigamente, fizemos uma playlist para nos ambientar essa viagem no tempo. Ouça abaixo “Memórias de São Paulo”:
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Adoro quando falam de moda e história juntas,pois estão ligadas.
O que ocorre no mundo numa época,tem relação com o que vestimos.