Quem colecionava papéis de carta nos anos 80 e 90 certamente tinha alguns que ilustravam personagens, sejam crianças ou animais, com olhos aumentados e expressivos. Talvez não seja a artista por trás desses colecionáveis, mas essa estética se deve a Margaret Keane, que a criou nos anos 50.
Seus quadros foram consagrados entre os anos 50, 60 e 70 e sua real história rendeu um filme lançado em 2014 e produzido por Tim Burton, que também é fã da artista e a tem como referência em suas produções. Aliás, como todo filme de Burton, este, intitulado Grandes Olhos, vale a pena assistir não apenas por ser ambientado no passado como também por ter a atriz Amy Adams, que já é bem reconhecida na pele de personagens históricos, no papel de Margaret.
A carreira injustiçada de Margaret Keane
A americana, cujo nome verdadeiro é Peggy Doris Hawkins, tinha problemas de audição desde os dois anos de idade e, portanto, aprendeu a captar as emoções das pessoas que falavam com ela olhando-as diretamente nos olhos, já que não tinha muita capacidade de ouvir a entonação de voz durante a conversa. Isso serviu de referência em suas então futuras obras.
Ela começou a desenhar aos dez anos de idade e já tinha como principal tema os personagens e suas emoções. De acordo com uma entrevista concedida para o canal KQED Arts, sua primeira obra foi feita ainda na infância e ilustrava duas garotinhas, uma sorrindo e outra chorando, além de ter sido um presente para sua avó. Mas ela só se profissionalizou no ramo aos 18 anos, pintando roupas e berços até os anos 50, quando ela passou a trabalhar com retratos simples de pessoas e animais domésticos com olhos aumentados.
As décadas de 50 e 60 foram um período de glória para as suas obras, porém não de forma justa. Divorciada e com uma filha, ela conheceu o corretor imobiliário e também pintor Walter Keane. Os dois se casaram em 1955 e, de olho no talento e estilo característico de Margaret, ele passou a vender as obras da artista alegando ser de sua própria autoria. Ela permaneceu calada por duas décadas, pois seu marido a convenceu de que “as pinturas teriam mais credibilidade se fossem assinadas por uma figura masculina e, portanto, conseguiria vender todas elas”.
A verdade veio à tona
Margaret se separou de Walter em 1965, mas só revelou que ela era a verdadeira autora das obras em 1970 durante uma entrevista de rádio. Para provar o que ela disse, um repórter do jornal San Francisco Examiner promoveu uma competição de pintura entre a artista e o ex-marido, que seria coberta pela mídia, mas Margaret foi a única que compareceu e aceitou o desafio. Depois desse episódio, a revista Life declarou oficialmente verdadeiro o depoimento da artista e corrigiu toda a história de suas pinturas em um artigo.
Este caso também foi parar nos tribunais. Nos anos 80, Margaret venceu um processo de 4 milhões de dólares contra Walter e o veículo USA Today, que publicou um artigo retrucando o da Life. Para tal, o juiz ordenou que cada um pintasse um personagem de olhos grandes. Enquanto Walter recusou a proposta alegando dores no ombro, Margaret fez a pintura dela em 53 minutos. “Eu realmente sinto que a justiça foi feita, que funcionou, mesmo se eu não tivesse recebido os 4 milhões de dólares”, conta a artista.
Depois de todo esse caso, a artista continuou pintando seus personagens de olhos grandes, mas agora com expressões mais alegres. Ela também virou referência para vários pintores e cartunistas, entre eles o criador de As Meninas Super Poderosas, Craig McCracken, além de ter feito pinturas personalizadas para várias celebridades.
Hoje, aos 94 anos, ela vive na Califórnia ao lado de sua filha Jane e de seu genro Don Swigert e tem suas obras expostas em museus e galerias do mundo todo, assim como à venda em sua loja online.