Nas décadas de 1940 e 50, tempos boêmios do Rio de Janeiro, existia um lugar que reunia grande parte da sociedade da época. A Praça Tiradentes se fez famosa por abrigar o encantador Teatro de Revista e seus importantes espetáculos, boa parte deles, comandados pelo produtor e autor Walter Pinto.
Estamos falando de uma época em que não existia televisão, portanto o grande passatempo e diversão das pessoas era ir ao teatro. Mas as peças daquela época eram um pouco diferentes das de hoje. Seguiam teor e senso crítico por se espelharem nos costumes e tradições do povo.
A Revista, gênero do teatro que ficou conhecido em todo País, surgiu no final do século 19 por Artur Azevedo. Em parceria com o seu irmão Aloísio, escreveram o que ficou conhecido por “Revista do Ano”. No início do ano montava-se uma peça que passava, em revista, os fatos que marcaram o ano anterior, abordando contexto mais crítico recheado de sátiras políticas.
Com formato inspirado nos espetáculos franceses, o Teatro de Revista sofreu constante mudança ao longo do tempo. Os autores foram adotando para este teatro personagens de nossa história, como os portugueses, a mulata, o carioca, entre outros, trazendo o que o público queria ver e ouvir.
As Vedetes e o apelo à sensualidade
O apelo à sensualidade foi um fato marcante do teatro, afinal, quem não gosta de apreciar a beleza feminina. As Vedetes, como ficaram conhecidas, eram atrizes que se sobressaiam durante as apresentações. Mulheres de biquínis ou maiôs, escolhidas pelas curvas, altura, beleza do rosto e simpatia. Seu papel era atuar em números de improvisação com diálogos mais íntimos com o público.
Elas entravam no palco ao som de grandes orquestras e, ao abrir a cortina, todo o elenco descia uma escadaria, desfilando luxo em plumas e paetês. Uma passagem bastante interessante, contada pela atriz e vedete Berta Loran, é que naquela época não se falava palavrões. Nabos e Pipinos substituíam, de maneira divertida, o vocabulário para assuntos mais picantes.
Muitas mulheres que atuaram como vedetes eram, também, vistas como prostitutas, mas encaravam o preconceito da melhor forma possível. Inclusive, a minissérie que retratou a história da saudosa Dercy Gonçalves, relata muito essa passagem, de que o uso de um batom mais forte significava, para os mais conservadores, uma mulher de caráter duvidoso.
O povo se deslumbrou com o Teatro de Revista, já que, grandes cabarés da boemia francesa, como Folies Bergere, influenciaram as produções nacionais. Um dos fanáticos pelo Teatro de Revista foi o ex-presidente Getúlio Vargas – alvo de inúmeras sátiras em peças.
Vargas gostava não só do gênero, mas das mulheres que desfilavam no palco. Uma passagem bastante interessante é que Getúlio foi ao teatro no dia em que um dos atores apareceu vestido e cantando com sotaque do presidente; a reação de Vargas foi a melhor, deu muitas gargalhadas.
Os bastidores do Teatro de Revista
Além do talento de muitos atores como Oscarito, Grande Otelo, Ankito, a produção destes shows era muito rica, o que enchia olhos da plateia. Walter Pinto fazia o palco virar uma lagoa, em questões de segundos, para um próximo ato, tanto que ele teve que instalar um poço d’água para que tudo saísse como planejado.
Pinto mantinha orquestra com 70 músicos e, todos os anos, chegava com 12 bailarinas de Paris e de Buenos Aires. O produtor não admitia que os seus espetáculos fossem chamados de Teatro Rebolado, gênero que, também, ficou bastante conhecido.
Nessas idas e vindas de Walter Pinto, ele trouxe para o Teatro de Revista Brasileiro, a artista Ivaná, primeiro transexual de grande sucesso nos espetáculos franceses e que causou muito ciúmes em Virginia Lane, a mais importante vedete da era Walter Pinto.
Polêmicas da época
Vale lembrar que, na época, existiam as vedetes mais tradicionais, que não se utilizavam da nudez, e as bailarinas que ficavam com seios à mostra, nudez que apareceu nos palcos em 1922, durante a excursão da Companhia Francesa Ba-ta-clan. A princípio, só as vedetes estrangeiras podiam tirar a roupa. Depois, o “privilégio” foi estendido às brasileiras, com uma condição: tinha de ser a chamada “nudez estática”, com as mulheres nuas no palco, mas sem se mexer.
Nuas ou não, foram inúmeras as grandes brasileiras que fizeram sucesso como vedetes do Teatro de Revista, tanto, que aqui não daria para enumerarmos todas, mas podemos citar as mais importantes que foram: Aracy Cortes, Angelita Martinez, Anilza Leone, Berta Loran, Carmem Verônica, Consuelo Leandro, Dercy Gonçalves, Elizabeth Gasper, Elvira Pagã, Ilka Soares, Iris Bruzzi, Luz Del Fuego, Mara Rubia, Maria Pompeo, Salomé Parísio, Marli Marley, Nélia Paula, Renata Fronzi, Rose Rondele, Sonia Mamede, Virginia Lane, Wilza Carla e Zaquia Jorge.
Muitas fizeram sucesso cantando e se apresentando ao som de marchinhas de carnaval, entre as canções entoadas na época, estão Sassaricando, de Virginia Lane; Vai com Jeito e Chiquita Bacana, de Emilinha Borba; Boneca de Pixe, de Ary Barroso; Eu Dei, de Carmen Miranda; e muitas outras. Vale ressaltar que também existiram apresentações burlescas naquela época; Elvira Pagã e Luz del Fuego, por exemplo, faziam números que tinham essa inspiração no Teatro Vaudeville americano.
Não demorou muito para que o Teatro de Revista Brasileiro recebesse a participação de Célebes artistas estrangeiros, como a dançarina Josephine Baker, que cantou Boneca de Pixe ao lado de Grande Otelo, em 1939. Participação que, mais tarde, foi feita por Virginia Lane, famosa não só por sua beleza e talento, mas pelo discreto romance de 15 anos que manteve com Getúlio Vargas. Nos boatos da época, dizem que o ex-presidente a batizou de “Coelhinha”.
Foi ela a detentora do sapato plataforma, por conta de sua baixa estatura – mais tarde usado por Carmen Miranda pelo mesmo motivo – e dos collants com recortes que deixavam a virilha à mostra. O Brasil todo viajava para ver Virgina Lane, estrela que manteve viva a magia das vedetes por muitos anos, juntamente, com seu grupo musical de vedetinhas.
O Teatro de Revista é muito rico em histórias e feitos, tanto que não daria para contá-los em apenas um texto. Portanto, logo mais traremos outras peripécias da era Walter Pinto e tudo o que rolava nos bastidores dos famosos espetáculos da Praça Tiradentes, contado pelas próprias vedetes, em entrevista recente feita no Rio de Janeiro. Imperdível!
Nossa, quem matéria maravilhosa!
Adorei saber de algumas curiosidades que não conhecia.
Parabéns pelo portal!
:D
Desiree muito obrigada pelo carinho, fico contente que tenha gostado da matéria. Um grande beijo.
Obrigada Desirre, ficamos felizes que gostou do portal. E realmente a matéria está incrível.
muito boa a suas materia amiga , adorei , parabens
Leonardo muito obrigada pelo retorno, fico muito contente que tenha gostado da matéria.
Estou em êxtase após a leitura deste artigo! Eu, sendo amante incondicional de chanchadas e Teatro de Revista, desconhecia algumas das informações do texto. Me sinto maravilhada quando vejo exaltarem desta maneira a arte nacional!
Mil beijos,
Rafaella.
Rafaella fico imensamente feliz que tenha gostado da matéria e por saber que você também admira essa cultura tão rica que temos aqui no Brasil. Obrigada por este retorno tão carinho e mil beijos para ti também linda.
Estou em êxtase após a leitura deste artigo! Eu, sendo amante incondicional de chanchadas e Teatro de Revista, desconhecia algumas das informações do texto. Me sinto maravilhada quando vejo exaltarem desta maneira a arte nacional!
Mil beijos,
Rafaella.
http://imperioretro.blogspot.com
Bom dia,
Estamos organizando um curta sobre a participação feminina no processo de valorização do samba. E a importância das mulheres nesse processo.
Historicamente consideramos a Aracy Cortes e o Teatro de Revista fundamental.
Você poderia gravar um depoimento falando sobre o Teatro de Revista e as Vedetes em geral para usarmos como contextualização?
Caso positivo, poderia enviar um contato telefônico?
Grata, Edna.
Passei o seu contato para a Aurora, ok? :) Obrigada!
Parabéns é pouco pela iniciativa Aurora D’Vine ou melhor Cinthia.
Sou fan daquela época da qual sou testemunha ocular.
Tenho várias matérias e fotos das nossas maravilhosas vedetes. No que precisar estou à disposição para contribuir.
Só me falar pos Email
Abraços
Sergio
Oi Sérgio, que demais!
Já tem um tempo que queremos fazer matérias sobre essas revistas. Com certeza entraremos em contato :)
Boa noite!
Estou fazendo uma pesquisa sobre um casal que participou de um teatro itinerante entre 1920 e 1930, eram conhecidos como Duo Max.
Ele chamava-se Miguel Max (Máximo) e ela Maria Max (Máximo)
Ela veio de Portugal em 1919. Percorreram o Brasil apresentando peças, inclusive soube através de uma biografia do nosso querido Grande Otelo que Miguel Max foi seu tutor durante um período.
Também descobri através de um jornal do Maranhão que fizeram uma apresentação no Teatro Arthur Azevedo, entre outras.
Você por acaso tem alguma informação para me ajudar?
Obrigado
Olá Silvio, tudo bem? Sei pouco sobre esse casal de artistas, vindo de Portugal. Infelizmente, a gente encontra mais informações sobre as revistas em livros. Eu tenho um livro que se chama “Fora do Sério – um panorama do Teatro de Revista no Brasil”. Vejo se encontro alguma citação e te aviso.
Um abraço.
Oi Silvio, ficamos muito felizes com o interesse do seu comentário. A Cinthia, que fez a matéria, não está conseguindo responder, mas segue a resposta dela:
“Olá Silvio, tudo bem? Sei pouco sobre esse casal de artistas, vindo de Portugal. Infelizmente, a gente encontra mais informações sobre as revistas em livros. Eu tenho um livro que se chama “Fora do Sério – um panorama do Teatro de Revista no Brasil”. Vejo se encontro alguma citação e te aviso.
Um abraço.”
Esperamos que a gente tenha o ajudado.
muito interessante. estou pesquisando o tema.
minha avó foi “girl” do cassino da urca.
tenho algumas fotos com grande otelo
gostaria de pesquisar mais
Que maravilhoso isso!
Incrível o post. Uma época muito diferente da atual. As mulheres (vedetes) foram desbravadoras. Nunca época em que sua voz não podia ser ouvida elas acharam na arte uma forma de se expressar. Pena que algumas delas como Wilza Carla terminaram seus dias esquecidas.
Tem um material bacana sobre a Wilza que encontrei e deixo como forma de colaborar com este artigo. Parabéns”
https://ano70.com.br/wilza-carla-de-vedete-ao-esquecimento/
Que incrível a entrevista!
A vida de Zaquia Jorge já foi letra de musica (samba-enredo) das antigas anos 1960/1970. Virginia Lane geralmente é mais lembrada, Wilza Carla, Carmen Verônica,Dercy Gonçalves… tempo da minha avó!!Pré-Pornôchanchada!!- marcio silva de almeida – jlle/sc
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Excelente materia. Ha tempos vinha buscando informacao sobre este periodo da historia do teatro brasileiro.
Prezada Cinthia,
Notável seu texto!
Tenho gratas lembranças de fotos (e fatos) relacionados ao Teatro de Revista. Há um meu conterrâneo, Joselito Matos, de Alagoinhas-BA, que, na década de 1950 foi um famoso cenógrafo, muito ligado a Walter Pinto e a suas produções. Se você tiver acesso a fotos de cenários de autoria de Joselito, ficarei muito grato se puder me informar onde encontrá-las. Ou, como imenso favor, remeter pelo menos uma foto ao meu e-mail.
Abs.
Fernando Meyer
fernandomeyer2002@gmail.com