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Raízes do rock ‘n roll: Do blues dos campos de algodão ao rebolado de Elvis Presley

16 de setembro de 2015, por DJ Wagnão
Música

Os homens que vieram desbravar as colônias americanas eram, antes de tudo, duros, abnegados e dispostos a vencer, a qualquer preço, com a força de seus braços, dominando os animais, cultivando a terra e lutando contra tudo e todos, até tornar aquele território hostil e, tardiamente, colonizado na colossal potência babilônica dos tempos modernos. No entanto, não seria branca a mão de obra que arcaria com o trabalho massacrante.

Desde o início do século 17, o colonizador branco passou a trazer negros do Congo e Senegal, já que os índios nativos não se prestavam a tanto, preferindo a morte ao trabalho escravo. Foi negado aos negros os direitos elementares, não lhes permitindo sequer conversar durante o trabalho. Mas, ao menos, os brancos deixavam que cantassem.

Negros durante o trabalho nas plantações de algodão

Negros durante o trabalho nas plantações de algodão (Foto: Reprodução)

Como última válvula de escape, numa existência avilta, suas “works songs” eram entoadas durante longas horas de labuta, juntamente com as “dance songs” ou “reels”, na qual se esforçavam para manter a mínima identidade cultural, fornecendo, assim, a matéria prima para as formas básicas de música negra americana de raiz, os tradicionais BLUES e SPIRITUAL.

A música negra 

O blues, um grito e lamento, abordando os acontecimentos do dia a dia, desejos e desilusões amorosas, injustiças e sofrimento da batalha pela vida. Já o spiritual, apenas lamentos, falando sobre arrependimentos e esperanças de salvação religiosa. No entanto, em ambos estilos, permanecia a mesma força instintiva, indomesticável, insinuando-se às mínimas brechas da dominação que os negros sofriam.

O blues dos campos se tornaria, no século passado, o ritmo do negro pobre, desempregado e segregado das cidades, no qual já não se limitaria aos vocais, batidas de mãos e pés, banjos, harmônicas e violinos caseiros. O som passaria a ser tocado também em instrumentos europeus mais sofisticados, como o piano, trompete, trombone, clarinete, etc.

Assim, tendo pior ou melhor aceitação pelos brancos, como o jazz, ragtime e o boogie, porém sua força selvagem, seu apelo erótico e sensual, seu árido realismo ao tratar dos fatos do cotidiano, se manteriam. O primeiro ensaio de depressão da América já se fizera ao som de derivações do blues, como o dixeland. Porém a grande depressão fez abortar essa tímida redescoberta dos corpos e justificou um novo acesso puritano, com a lei seca, a volta da austeridade, imposição rigorosa dos estereótipos do “certo”.

Lei Seca

A Lei Seca americana durou de 1920 a 1933 (Foto: Reprodução)


Os novos puritanos

No cinema, por exemplo, era tratado o estereótipo da mocinha prendada e assexuada e do mocinho de cabelos cortados rentes, ambos avessos a bebidas e cigarros e aventuras transviadas. Essa traição aos instintos, ociosamente obedecida pelos brancos, parecia aos negros pura hipocrisia. Convivendo com o desprezo e recriminações dos brancos durante todo o dia, vingavam-se à noite, cantando e dançando ao som de suas músicas cheias de sensualidade e força vital.

O sentimento piegas e neurótico da canção americana, com suas rimas certinhas e suas palavras elegantes era tão contrastado com as letras grosseiras e sem eufemismo, palavras vulgares e insinuações de todos os tipos. Apesar das fortes censuras, os reclames instintivos eram fortes demais. Acabavam por encontrar forte expressão cantores como Frank Sinatra, na década de 40, que arrebatavam corações das jovens moçoilas que faziam parte de uma geração marcada pela guerra.

Frank Sinatra e fãs

Frank Sinatra e fãs (Foto: Reprodução)


Juventura transviada

Em uma antevisão do que viria a ser percebida no reinado do rock ‘n roll, pode ser encontrada no início da década de 50, durante as performances ao vivo de Johnnie Ray, cantor desesperado, cujos prantos, soluços e lamentações provocavam reações ambivalentes na plateia feminina. O introvertido Johnnie se transfigurava em cena, se contorcendo, gaguejando, requebrando. As moças iam a loucura.

Não sem razão, um jornalista americano observou que “se Elvis Presley foi o messias da era pop, Ray fez o papel de João Batista”. É importante ressaltar que, nesse período, os americanos estavam voltando da Segunda Guerra Mundial. Mesmo que vitoriosos, é impossível sair de uma guerra sem sequelas, ou seja, seus soldados voltavam totalmente desconfiados do governo e, certamente, a proximidade com a morte fez com que eles passassem a ver a vida de uma maneira bem mais diferente.

E esse desencanto se transmitiu diretamente nas gerações seguintes, a dos beatniks e rebeldes sem causa, de James Dean e Marlon Brando. Nos setores mais avançados, a juventude grassava o inconformismo a procura de novas experiências e sensações, a ânsia do prazer imediato, de extrair o máximo da vida no presente e não se preocupar com o amanhã.

Essa imagem de rebeldia, principalmente, no cinema, fascinava o restante dos jovens, os menininhos cujos pais emprestavam a chave do carro para uma chegada ao drive-in, as menininhas ansiosas, porém, temerosas de se entregar aos namorados.

Cena de Juventude Transviada

Cena de Juventude Transviada (Foto: Divulgação)

Não podia se esperar deles uma opção tão extremada como às dos beatniks e delinquentes juvenis, mas bastava um empurrão para que uma metamorfose se processasse. A rigidez puritana cabia numa sociedade onde o trabalho era principalmente braçal e exigia grande esforço físico. A crescente automatização das atividades produtivas liberava energias para outros desempenhos e reacendia desejos, até então, sublimados na luta diária.

A prosperidade dos Estados Unidos, que se consolidava como potência imperial, convidava ao relaxamento dos costumes. E as novas gerações, educadas pela linguagem não verbal do cinema e TV, tendiam à ação direta, sem muita reflexão. Todo cenário estava montado para a explosão do rock. Bastava apenas um empurrão.

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