Johnny Thunders & The Heartbreakers é uma clássica banda da cena punk rock internacional. Iniciada em Nova Iorque, no ano de 1975, a banda teve uma trajetória explosiva entre os anos de 1970 e 1980, que chegou ao fim com a morte de Johnny Thunders em 1991, seguida da morte de Jerry Nolah em 1992.
Se ainda todos estivessem em atividade, esse ano a banda completaria 30 anos de estrada. Para saber mais detalhes de sua história, conversamos com Walter Lure, guitarrista e único integrante vivo da banda, atualmente membro da The Waldos, que nos conta sobre sua trajetória com os Heartbreakers, suas influências musicais, a primeira vez que no tocou CBGB (clássico clube de Nova Iorque que abriu espaço para bandas da época, conhecido como o berço do punk rock que fechou suas portas em 2006), o relacionamento entre os membros do grupo, a relação com as drogas, entre outras experiências da banda. Confira:
Universo Retrô – Como você entrou para os Heartbreakers?
Walter Lure – Johnny foi o primeiro que me chamou para fazer parte depois de me ver em um show com os Demons. Nós ensaiávamos no mesmo local dos New York Dolls, então eu já os conhecia. Quando eles (Dolls) acabaram, Johnny procurava por outro guitarrista. Richard Hell e Jerry Nolan já haviam iniciado os Heartbreakers, mas precisavam de outro guitarrista. Johnny me chamou para um teste e eu fui, só que foi apenas um mês depois que Jerry Nolan finalmente me chamou durante um show e perguntou se eu queria entrar na banda. Naturalmente disse que sim e o resto é história.
Universo Retrô – Você tocava nos Demons anteriormente de assumir nos Heartbreakers. Fale um pouco sobre suas influências musicais.
Walter Lure – Entrei nos Demons seis meses antes de entrar nos Heartbreakers. O vocalista (dos Demons) conhecia os New York Dolls porque ele costumava vender drogas aos Dolls, e dividíamos o mesmo espaço para ensaio. Os Demons eram uma boa banda, mas o vocalista queria ser o centro das atenções e as canções eram medíocres. Minhas principais influências vieram da Invasão Britânica, de bandas de rock como Rolling Stones e Yardbirds. Todos meus guitarristas favoritos eram britânicos: Eric Clapton, Jeff Beck, Jimmy Page e, meu favorito, Mick Taylor. Eu amava canções curtas e rápidas de rock com solos de guitarra selvagens. Mais ou menos a mesma coisa que Johnny e Jerry gostavam.
Universo Retrô – Como foram as primeiras vezes que vocês tocaram no CBGB?
Walter Lure – A primeira vez que tocamos no CBGB foi uma experiência incrível para mim. Era o festival de 4 de Julho em 1975 do clube, e eu tinha tocado no meu último show com os Demons na sexta-feira à noite, onde haviam vinte ou trinta pessoas na plateia. Na noite de sábado, primeira com os Heartbreakers, o local estava cheio até o teto de pessoas gritando o tempo todo. Em uma noite eu havia passado de uma banda de rock chata para uma das mais populares bandas em Nova York. Eu estava no Paraíso!
Universo Retrô – Nos conte sobre a experiência dos Heartbreakers na Anarchy Tour. O que você lembra da turnê?
Walter Lure – Foi outra experiência louca. Deveria ser vinte e seis shows e acabamos fazendo apenas seis. Por causa da controvérsia sobre os Sex Pistols na televisão a maioria das cidades cancelaram os shows, com exceção de algumas. Então nós, os Sex Pitols e o Clash viajávamos de ônibus o dia todo e quando chegávamos na cidade seguinte o show havia sido cancelado, e acabávamos bebendo no bar do hotel a noite toda. Nos tornamos grandes amigos naquela turnê.
O público era louco e os shows que fizemos foram muito divertidos. A cena punk britânica era completamente diferente da cena punk de Nova York – todas as bandas eram mais novas e mais loucas, assim como os penteados de cabelo – Eu também gostei mais do som deles, mas nem todas as bandas eram grandes músicos ainda – eles eram um pouco mais novos que nós, então estavam aprendendo a tocar e escrever melhor. Minha banda favorita lá sempre foram os Sex Pistols.
Universo Retrô – Por que a primeira edição do L.A.M.F. foi mal remixada?
Walter Lure – Nunca achei que o problema foi a mixagem, embora todos a culpem. Esse álbum foi remixado umas cem vezes por vinte pessoas diferentes e sempre soava bem no estúdio. Mas, quando transferida para o vinyl, toda a presença do som ficava abafado. Nós o remasterizamos umas dez vezes, mas nunca dava certo por alguma razão até hoje desconhecida. Johnny e Jerry tiveram o mesmo problema nos New York Dolls, cujas canções nunca soaram tão bem quanto em seus shows. Anos depois quando relançaram o L.A.M.F. em fita cassete e, depois, em CD, soou muito melhor – por alguma razão ele nunca soou bem em vinyl. C’est La Vie!
Universo Retrô – Por que você e Johnny dividiam os vocais? E quem compunha as músicas?
Walter Lure – Basicamente Johnny cantava o que ele escrevia e eu cantava o que eu escrevia ou o que Jerry ajudava a escrever. Nós dois nos sentíamos confortáveis cantando nossas próprias composições, e não havia problema em deixar o outro cantar seu material. No começo Richard Hell não queria que eu cantasse e queria que Johnny cantasse uma ou duas músicas. Hell queria ser o cantor principal e ele não conseguia cantar muito bem. Então Johnny, Jerry e eu deixamos Richard e achamos outro baixista que tocava muito melhor e não se achava um gênio.
Universo Retrô – Como era o relacionamento entre os membros da banda?
Walter Lure – Fazer parte de uma banda é como ser casado com três ou quatro pessoas que nem sempre são apaixonadas. Todos começam a brigar ou dar nos nervos dos outros depois de um tempo – é um dos problemas que todas as bandas tem que lidar porque você passa muito tempo junto. Então alguns dias Jerry e eu ficávamos bravos com Johnny e outros dias Jerry e Johnny ficavam bravos comigo. Outro dia Johnny e eu ficávamos chateados com Jerry ou Billy. Ás vezes uma facção de membros se junta contra outro membro da banda. Na maior parte do tempo nos demos muito bem, mas mais tarde houve problemas com drogas e ficou bem difícil de trabalhar junto.
One Track Mind, composição de Walter Lure e cantada por ele. Single dos Heartbreakers lançado em 1977.
Universo Retrô – Os Heartbreakers fizeram um grande retorno em 1984 com o show no Lyceum. Como se pode ver nas imagens, vocês reuniram um grande número de punks e roqueiros em geral na audiência. Do que você se lembra daquele show?
Walter Lure – Sim, aquele show foi muito divertido. Johnny tinha um novo empresário que fornecia drogas a ele, então ele (empresário) poderia manter Johnny sob controle. Eles organizaram uma turnê rápida em Paris e alguns shows pela Inglaterra antes do show no Lyceum, que foi filmado. Nós todos nos divertimos muito fazendo isso, mas o engraçado é – se você olhar no vídeo (do Lyceum) e depois ver vídeos de nossos shows em 1977, a banda parecia muito mais revigorada e enérgica em 1977. Estávamos todos usando drogas em 1984, então parecíamos muito mais velhos e menos entusiasmados.
Universo Retrô – Atualmente os Heartbreakers são conhecidos por muitos. Você imaginaria isso em 1977?
Walter Lure – Bem…na verdade eu acho que éramos mais populares em 1977 do que somos hoje. Mais pessoas nos conhecem hoje porque tem muito mais artigos e gravações sobre a banda desde então. Mas na época podíamos lotar teatros com cinco mil lugares e salas de concertos. Nós éramos parte da “Realeza do Punk Rock”, e poucas bandas eram mais populares que nós, pelo menos por um tempo. Não tenho certeza se conseguiríamos fazer aquilo atualmente, mas nunca saberei pois toda a banda já faleceu, com exceção de mim.
Universo Retrô – O que você considera o legado dos Heartbreakers?
Walter Lure – Não sei exatamente o que seria nosso legado, além do fato que amávamos canções de rock rápidas e sabíamos como interpretá-las daquela forma. Há várias canções clássicas que escrevemos e que ainda são tocadas por bandas atualmente, incluindo Chinese Rocks, Born to Lose e One Track Mind. Nós também vivemos uma vida louca por um tempo, mas outras bandas de rock tem a mesma história de vida assim e muitas drogas. Não é uma história única. As pessoas costumavam jurar que nós éramos a maior banda punk da época, mas ficarei contente se formos lembrados como uma das melhores – Acho que nenhuma banda pode clamar por ser a melhor de todas, e é assim que deve ser.