Dando continuidade a nossa série sobre clássicos cinematográficos disponíveis gratuita e integralmente na internet, preparamos uma lista de produções fundamentais para a evolução do gênero do terror. Cinco obras estrangeiras; do gótico ao terror noir, passando por suspense e drama psicológico. Cinco feitos extraordinários que compreendem o fascínio humano pelo medo. Escolha seu filme e boa sessão!
1. Häxan – A Feitiçaria Através dos Tempos (1922)
Häxan – Dinamarca, Suécia/ P&B/ mudo/ 87 min
Direção: Benjamin Christensen
Pioneiro do período mudo nórdico, Häxan explora as origens da feitiçaria e do satanismo desde a Pérsia antiga até o início do século XX, utilizando técnicas do cinema documental e de ficção. Christensen, que também aparece no longa-metragem como a personificação do Diabo, é um dos grandes diretores do cinema expressionista e precursor de filmes modernos sobre possessão demoníaca (como O Exorcista de 1973).
Dividido em sete capítulos que inicialmente se desenvolvem de maneira didática, Häxan intercala registros históricos, ilustrações e diagramas a uma mise-en-scène sinistra, ambientada em cenários claustrofóbicos, destacados por um intenso jogo de luz e sombra. Tudo isso combinado ao naturalismo dos elementos de cena (a nudez explícita, sexualidade, rituais de Sabá, inquisição, sacrifício, tortura e expurgo) fez de Häxan um filme transgressor para os padrões dos anos de 1920.
Censurado em diversos países da Europa, essa foi a primeira obra do cinema a mostrar com absoluta clareza o caráter estigmatizante e sexista da caça às bruxas, partindo do conceito medieval de que toda mulher socialmente “inadequada” seria portadora dos malefícios do mundo. Um clássico cult de grande importância para o cinema de terror, tanto em forma quanto conteúdo.
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2. As Mãos de Orlac (1924)
Orlacs Hände – Alemanha, Áustria/ P&B/ mudo/ 110 min
Direção: Robert Wiene
Dirigido pelo mestre do cinema expressionista Robert Weine, de O Gabinete do Dr. Caligari (1919), o longa-metragem é baseado na obra do escritor francês Maurice Bernard. A trama nos conta a história de Paul Orlac (Conrad Veidt, o sonâmbulo de Caligari), um pianista virtuoso que perde as mãos em um acidente de trem e acaba sendo submetido a uma experiência macabra de transplante. Tudo transcorre bem até que ele descobre que as mãos na verdade eram de um assassino condenado à morte.
O pianista fica transtornado e passa a acreditar que também tem predisposição para matar. Ambientado em uma atmosfera gótica e sombria, com cenas internas absolutamente escuras, em contraste com a amplitude das externas; o filme muito se aproxima da estética de F.W. Murnau em Nosferatu (1922), mas não dispensa a assinatura clássica de Caligari, utilizando a técnica de sobreposição de imagens para nos conectar ao perturbador estado de paranoia que aflige o personagem central.
O conflito entre Orlac e as suas mãos é definitivamente a grande potência emocional do longa, marcado por uma linguagem corporal que remete o exagero e o drama teatral, recurso esse já tarimbado pela escola expressionista alemã. As Mãos de Orlac é mais uma superprodução dos primórdios do gênero do terror que, apesar de seu enredo bastante inverossímil, influenciou o filme noir, famoso subgênero do cinema policial que atingiu seu ápice no início da década de 1940.
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3. Fausto – Um Conto Alemão (1926)
Faust – Alemanha/ P&B/ mudo/ 116 min
Direção: Friedrich Wilhelm Murnau
Do mesmo criador de Nosferatu (1922), F.W. Murnau, Fausto é uma adaptação da tragédia de Goethe sobre a lenda alemã do pacto com o diabo baseada em fragmentos históricos da vida do médico Johannes Georg Faust (1480-1540). O enredo de Fausto se concentra no personagem-título, um velho alquimista e de boa índole que começa a contestar as limitações do conhecimento humano diante da propagação da peste negra sobre sua cidade. Observado por um Arcanjo e pelo demônio Mephisto (Emil Jannings), Fausto (Gösta Ekman) vira objeto de uma aposta cujo propósito é o de corromper o que há de divino em sua alma. Assim, Mephisto desce à Terra e consegue, através de seus estratagemas diabólicos, um contrato de sangue conferindo a Fausto o poder, a glória, a juventude e até o amor de uma mulher, nesse caso, Gretchen (Camilla Horn); uma jovem camponesa cristã na qual ele enxerga uma real possibilidade de redenção.
Mas como todo bom pacto tem o seu preço, Fausto vai pagar caro para livrar a sua alma da danação. Realizado às vésperas da transição do cinema mudo para o falado, o filme falhou na tentativa de repetir o sucesso comercial de Nosferatu, fato esse atribuído ao declínio do expressionismo alemão e a intervenção do nazismo que naquela época já ascendia ao poder. Entretanto, Fausto é tido por muitos como obra máxima de Murnau em solo alemão. O destaque de atuação do longa vai para Emil Jannings, fazendo a linha do diabo zombeteiro, tipicamente sedutor e ardiloso que ainda povoa o imaginário popular.
As características do expressionismo, mesmo em seu momento menos esplendoroso, se fazem fortemente presentes no filme, evocando a batalha maniqueísta (o bem e o mal) em um esquema de distorção de luzes e sombras. Sendo a segunda versão da peça de Goethe (a primeira seria um curta de George Méliès), Fausto de Murnau é considerada pela crítica especializada a produção mais fiel à obra do escritor alemão.
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4. A Múmia (1932)
The Mummy – EUA/ P&B/ 72 min
Direção: Karl Freund
Depois das estreias de Dracula e Frankenstein em 1931, a Universal apostou alto em um novo monstro que pudesse dar sequência a sua bem sucedida franquia de filmes de terror, repetindo então a parceria entre o produtor Carl Laemme Jr. e Boris Karloff nessa produção faraônica. O enredo do filme obviamente já sabemos de cor, afinal A Múmia de Freund ganhou adaptações contemporâneas, a mais recente e famosa delas é a trilogia de aventura protagonizada por Brendan Fraser que, verdade seja dita, poder ser sim uma boa opção de entretenimento, mas não conta com tantos elementos prazerosos de se ver em uma tela quanto na produção de 1932.
A começar por Boris Karloff que dá vida a Imhotep, o sacerdote do Egito Antigo que após ser ressuscitado acidentalmente por um dos membros de uma escavação arqueológica, apavora a cidade do Cairo em busca da reencarnação de sua amada Ankh-es-em-amon. Mais uma vez irreconhecível na maquiagem do gênio da Universal Jack Pierce, Karloff alcança o ponto máximo de sua atuação, é clássico, assustador e carismático em igual medida, uma vez que não tem como deixar de se comover pela amarga peregrinação de Imhotep a fim de consumar um amor de outra vida. Os destaques também vão para as tomadas rápidas com câmera em movimento, o que na época surtiu como uma grande inovação da Universal, graças à influência dos longas Metropolis (1927), de Fritz Lang e Dracula nos quais o diretor estreante Karl Freund atuou como fotógrafo. Filme obrigatório para os adoradores do ciclo de monstros da Universal.
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5. A Casa dos Maus Espíritos (1959)
The House on Haunted Hill – EUA/ P&B/ 75 min.
Direção: William Castle
Em uma lista de filmes de terror que se preze não pode faltar um clássico sobre casas mal assombradas e nem mesmo deixar de fora o nome do inimitável Vincent Price. A Casa dos Maus Espíritos atende a esses dois requisitos com um enredo despretensioso, dirigido pelo cineasta William Castle, considerado o Alfred Hitchcock dos filmes B. Na trama, o milionário excêntrico, Frederick Loren (Vincent Price), cujas três primeiras mulheres morreram de forma suspeita, resolve dar uma festa para a atual esposa, Annabelle (Carol Ohmart), e convida cinco pessoas (escolhidas criteriosamente) para passar uma noite inteira em uma mansão cujo passado é marcado pelo assassinato de sete indivíduos.
O prêmio para aquele que sobreviver à macabra experiência do playboy é uma bolada de 10 mil dólares. Após uma apresentação do anfitrião aos seus convidados, o desafio é formalizado e todas as portas do casarão são trancadas, eliminando qualquer possibilidade de fuga ou auxílio externo. Uma série de eventos misteriosos então passa a envolver o ambiente sinistro da casa, aumentando a tensão e o clima perturbador de histeria. A Casa dos Maus Espíritos foi uma produção de baixo orçamento, mas o incrível retorno das bilheterias motivou William Castle a continuar realizando filmes baratos.
O roteiro pode possuir uma história convencional, cheia de elementos clichê do gênero do terror, mas a presença valiosa de Vincent Price e o fato de pertencer à década de ouro do cinema fantástico, fizeram deste filme um clássico indispensável para os amantes do terror. Em 1990, o longa ganhou um remake (muito inferior ao roteiro original) e que aqui recebeu o nome de A Casa da Colina, com Geoffrey Rush e Famke Janssen no elenco.
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