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Gypsy Queen: Cultura cigana é inspiração para o Pin-Up do Mês de julho

20 de julho de 2020, por Mirella Fonzar
Lifestyle
Pin-Up Cigana Universo Retrô

Como forma de celebrar o aniversário do Universo Retrô, anualmente nós, editoras, protagonizamos o Pin-Up do Mês com produções fotográficas especiais. Indo pelo caminho oposto do ano passado, com ensaios clicados em meio à natureza (relembre aqui os editoriais Senhora das Águas e Rainha do Cangaço); nos 5 anos do portal, as novas produções foram feitas em ambientes internos.

Como o restante do planeta, por conta da pandemia da COVID-19, tivemos que nos readaptar, inclusive, para colocar em prática algumas ideias de editoriais. Respeitando as medidas de isolamento social, decidimos, então, evitar produções externas e possíveis aglomerações.

Então, com equipe reduzida, as devidas medidas de segurança e muita criatividade, eu e a Daise Alves adaptamos um estúdio móvel com a fotógrafa Tainá Lossehëlin na sala de minha casa e o resultado não poderia ter sido mais incrível.

Pin-Up Cigana Universo Retrô
(Foto: Tainá Lossëhelin)

Coincidentemente, trouxemos novamente para o universo Pin-Up brasileiro um tema cheio de misticismo e riqueza cultural, neste ensaio batizado de Gypsy Queen.

Depois de recorrer a inspirações regionais para viver uma sereia no ano passado, resolvi apresentar uma cultura pouco abordada, que tem origem no continente asiático, mas sua história étnica é tão diversa que passa pelo oriente médio, europa, áfrica, oceania, américa, e, inclusive, também faz parte de nosso país: a Cultura Cigana.

Editorial Gypsy Queen: Processo Criativo

Para compor o cenário deste editorial, escolhemos elementos característicos da cultura cigana, que aparecem expostos em uma mesa redonda ou são manipulados por mim durante as fotos. São eles:

  • Bola de cristal;
  • Flores;
  • Pedras ametistas;
  • Baralho de Tarot Cigano;
  • Moedas;
  • Velas.

Para compor o figurino, seguimos com a mesma paleta de cores da cenografia: tons de roxo, lilás e violeta, branco, dourado e preto. Nas roupas, o ar vintage e o toque Pin-Up também não poderiam faltar nesta produção.

Blusa estilo “ciganinha” branca, saia preta godê com lenço roxo na cintura, e figurino arrematado por jóias douradas – colares de medalhas, luas e estrelas, anéis, pulseiras e brincos de argola. Na cabeça, um lenço com flores – duas indumentárias características das ciganas e do universo Pin-Up.

Pin-Up Cigana Universo Retrô
(Foto: Tainá Lossëhelin)

Vale destacar que as fotos inspiradas na cultura cigana foram feitas pela Tainá Lossëhelin tanto com luz natural, como com utilização de luz artificial; particularmente, amamos as duas maneiras. O fundo foi manipulado na pós-edição.

As Ciganas e o Universo das Pin-Ups

Mas, o que uma cigana, que tem origem oriental, teria a ver com fotografia vintage ou o universo das Pin-up Girls, algo totalmente ocidental? Muito mais do que apenas roupas coloridas, jóias e flores no cabelo, pode ter certeza.

Prova disso é que entre os anos 1930 e 1950, diversos ilustradores publicaram suas artes Pin-Up com este tema em calendários, revistas e afins. Entre eles, os americanos Gil Elvgren, Raymond Wilson Hammell, Fitz William Boynton e Forrest H. Clough, e o espanhol Alberto Vargas.

Pin-Up Cigana Universo Retrô
(Foto: Tainá Lossëhelin)

Mesmo ainda de forma estereotipada ou até superficial, a cultura cigana também aparece com frequência em pôsteres e enredos de filmes daquela época, como o caso de:

  • Cigana Feiticeira (Golden Earrings, 1947), estrelado por Marlene Dietrich;
  • Por Amor Também se Mata (The Gypsy and the Gentleman, 1958);
  • O Corcunda de Notre Dame (The Hunchback of Notre Dame, 1939);
  • Alma Cigana (Gypsy Wildcat, 1944).

O misticismo por trás dos ciganos também foi levado ao universo dos circos do passado, com curiosas apresentações dessas mulheres com arremesso de facas, encantamento de cobras, entre outras performances; e ainda aos parques de diversão através das máquinas Fortune Teller (Roda da Fortuna, em português), que imitavam ciganas e suas bolas de cristal, a fim de “adivinhar o futuro” de quem pagasse algumas moedas.

Pin-Up Cigana Universo Retrô
(Foto: Tainá Lossëhelin)

Mas, não é apenas o universo do passado que traz o tema à tona. As ciganas também aparecem com frequência no universo atual das tatuagens Old School e servem de inspiração para algumas Pin-Ups modernas e garotas de estilo alternativo retrô pelo mundo.

É o caso das irmãs gêmeas Dina Morti e Lady Munster, da Bósnia, país do sudeste europeu. Super sucesso no Instagram, ambas seguem um estilo bem único que mistura influências do horror vintage, fetichismo, universo místico das ciganas, dos circos e elementos das culturas indiana e árabe.

O Misticismo e Os Estereótipos Ciganos

Rodeada de misticismos e muitos estereótipos, a cultura cigana é tão vasta e cheia de histórias entrelaçadas, que fica difícil resumir tudo ou narrar o que é de fato lenda ou realidade.

Os ciganos estão espalhados em praticamente todas as regiões do mundo e pode-se dizer que são um povo bastante diverso, composto por diferentes grupos, cada um com seus próprios costumes, crenças, religiões e rituais e, além de tudo, influenciados pela cultura dos países onde vivem ou pelos quais passaram.

Pin-Up Cigana Universo Retrô
(Foto: Tainá Lossëhelin)

No imaginário popular, oscilamos entre o fascínio por suas crenças e tradições, e temores e receios alimentados por estereótipos relacionados ao seu jeito livre de viver a vida.

Enquanto as ciganas há milhares de anos despertam a curiosidade dos mais supersticiosos, pela sua ligação com a arte de prever o futuro através de cartas de tarot, bolas de cristal ou leitura de mãos; a maioria de seu povo, por viver o agora e não se fixar num só lugar – seja por escolha própria ou falta de oportunidades -, geralmente são julgados e sofrem preconceitos e exclusões na maioria das regiões onde escolhem viver.

Os Ciganos no Brasil e no Mundo

Com seus primeiros povos originários provavelmente da Índia (digo provavelmente, pois essa é uma cultura com pouca documentação histórica sobre suas origens), os ciganos chegaram ao Brasil na segunda metade do século XVI, expulsos de Portugal.

Não se sabe ao certo sobre a quantidade de famílias deportadas na época, nem para quais regiões foram levadas. O que se sabe é que até hoje há ciganos nos quatro cantos do território brasileiro. Sua população gira em torno das 500 mil pessoas – não sabemos a quantidade exata, pois, infelizmente, o IBGE não inclui esse grupo em suas pesquisas desde 2013.

Pin-Up Cigana Universo Retrô
(Foto: Tainá Lossëhelin)

A maioria dos ciganos brasileiros são de etnia “Kalon”, nômades com origens ibéricas – isto é, vindos de Portugal e Espanha – porém, existem outras etnias espalhadas pelo Brasil. Suas comunidades estão presentes também em outros países da América Latina, como Argentina, México e Colômbia.

Isso explica o fato de que, muitas vezes, quando pensamos no povo cigano, automaticamente, os relacionamos à cultura espanhola. Para se ter uma ideia da dimensão dessa comunidade, só na Espanha, estima-se haver mais de 700 mil ciganos só hoje em dia.

Pin-Up Cigana em ensaio místico
(Foto: Tainá Lossëhelin)

Os ofícios tradicionais dos ciganos pelo mundo basicamente podem ser divididos entre três categorias: artesanato, comércio e entretenimento, podendo estar ligado a vendas de produtos, artes adivinhatórias e esotéricas, apresentações de dança, teatro, circo, entre outras.

No caso dos Kalon, os homens costumam trabalhar no comércio informal, as mulheres realizam a leitura de mãos (quiromancia) nos centros da cidades; os valores conseguidos pelos serviços são utilizados para custear as despesas diárias da família. A propósito, os ciganos também são conhecidos por terem famílias numerosas e um grande número de filhos.

Leitura de mãos em ensaio cigano
(Foto: Tainá Lossëhelin)

Segundo o site Embaixada Cigana, que documenta atualmente essa cultura no Brasil, a maioria dos Kalon vive em áreas denominadas de “pouso”, que podem ser acampamentos em terrenos públicos ou privados, cedidos, ocupados ou arrendados.

Geralmente ficam próximos a estações ferroviárias ou metroviárias de grandes cidades, para facilitar o fluxo de homens e mulheres da comunidade. Apesar de estarem em centros urbanos, costumam também cultivar tradições rurais nestes locais, como criar galinhas ou porcos.

Moedas, velas, bola de cristal, tarot em ensaio mistico pin-up
(Foto: Tainá Lossëhelin)

Ciganos e religiosidade

Os ciganos não têm religião própria ou seguem uma religião específica. Eles geralmente adaptam-se aos dogmas religiosos do país onde vivem e os misturam com suas próprias crenças e superstições. Muitos são os que seguem o catolicismo e, no Brasil, ainda é possível encontrar de ciganos evangélicos a umbandistas.

A figura dos ciganos, apesar de não ser necessariamente ligada à cultura africana, desempenha um papel importante na Umbanda. Como uma das mais recentes linhas da religião afro-brasileira, acrescentada a pouco mais de 25 anos, a linha dos Ciganos traz em sua mensagem a necessidade do desapego, da liberdade, do amor e da alegria de viver.

Velas místicas para ensaio pin-up
(Foto: Tainá Lossëhelin)

Outro ponto interessante é que independente da religião particular de cada cigano, a maioria têm em comum a devoção à Santa Sara Kali. Canonizada em 1712 pela Igreja Católica, a figura é padroeira do Povo Cigano e das mulheres grávidas.

O nome kali quer dizer “negra” em hebraico, por isso, nas imagens, Sara é representada como uma mulher de pele negra que traz um lenço sobre a cabeça, símbolo de sua pureza e consagração a Deus.

Misticismo inspira ensaio pin-up
(Foto: Tainá Lossëhelin)

Há um lema na cultura cigana que descreve bem essa liberdade e sincretismo religioso: “A terra é minha Pátria, o céu é o meu teto e a liberdade é a minha religião”.

Apesar dessa diversidade de credos, os ciganos continuam a ser um povo cheio de espiritualidade, crenças nos dons sobrenaturais e nos elementos da natureza. Além da leitura do futuro através das mãos ou das cartas, acreditam no poder das pedras, das flores, da lua, do fogo, e por aí vai.

Cigana, o que conta sobre o futuro?

A escolha do tema sobre cultura cigana para este editorial não foi totalmente aleatória. Além de apresentarmos curiosidades de uma cultura pouco conhecida para a maioria de nossos leitores, aproveitamos para repensar um pouco sobre nossa própria forma de viver e nossas expectativas futuras, neste momento tão delicado e incerto que estamos passando por conta da pandemia da COVID-19.

Pela primeira vez na vida, tivemos que parar para refletir sobre o que realmente importa e fomos obrigados a dar uma freada nos milhares de planos futuros que costumamos fazer e passar a apenas a viver o agora, assim como os ciganos, na expectativa de um amanhã mais tranquilo.

Pin-Up Mistica em ensaio Gipsy Queem do Universo Retrô
(Foto: Tainá Lossëhelin)

Falo por experiência própria. Quando a pandemia começou, eu já não conseguia mais dormir sem medo, achando que o futuro não chegaria, que a minha vida – assim como de muita gente – havia acabado ali, junto com o surgimento deste vírus.

Pensava, pensava e não conseguia clarear minha mente, tamanha era ansiedade. A televisão não ajudava. As redes sociais muito menos. Os noticiários não traziam nenhuma esperança. O futuro parecia tão incerto e nebuloso; o medo foi tomando conta de mim.

Cigana é tema para ensaio pin-up
(Foto: Tainá Lossëhelin)

O tempo foi passando. O isolamento endurecendo. Mais dias sem ver ninguém além do meu marido e filho, sem frequentar nenhum lugar além de breves idas ao supermercado, sem poder ver meu filho desbravar o mundo.

Tentei me desconectar cada vez mais das más notícias, mas sem deixar de me proteger. Fui aos poucos deixando todas essas preocupações sobre o futuro para trás e vivendo o agora, um dia após o outro. Não que eu não estivesse mais receosa com tudo o que está acontecendo, mas de que adiantaria entrar em pânico?

Misticismo cigano como inspiração para ensaio pin-up
(Foto: Tainá Lossëhelin)

Assim, fui me condicionando a viver de forma mais leve, tomando os cuidados necessários, claro, porém, aceitando as condições atuais. E a vida foi ficando realmente melhor, mesmo em meio a um cenário externo de caos e sem grandes expectativas futuras a curto prazo.

Resolvi mudar de casa, já que aquele apartamento já não cabia mais os nossos sonhos e seria ali que provavelmente ficaríamos presos o resto do ano ou até quando durasse a pandemia. Viemos, então, para uma casa maior, um pouco mais distante do centro da cidade, onde podemos ver o céu, cultivar plantas e ver nossos filhos crescerem com mais calma.

Ciganos, Os Filhos do Vento

Sim, filhos, no plural! Em meio a todas essas incertezas sobre o futuro e tantas notícias trágicas, os ventos nos trouxeram a notícia de uma nova gravidez. Surpreendentemente, uma gravidez de gêmeos bivitelinos; duas novas vidas com previsão de nascimento no dia de Natal ainda deste ano. Um sinal maior de esperança futura, impossível, né?

De repente, tudo mudou. Surgiu, então, algo para nos apegarmos ao futuro. Ao invés do medo e da insegurança, resolvemos aceitar nosso destino e apenas curtir a ideia de que em breve teremos três moleques correndo pela casa.

Talvez os mais céticos pensem que somos loucos em colocar mais duas vidas no mundo neste momento. A gente prefere se apegar ao otimismo de um futuro melhor mesmo. Deixamos de nos preocupar tão intensamente com a morte – que infelizmente é inevitável – para saudar a vida.

Grávida pin-up com estilo cigana
(Foto: Tainá Lossëhelin)

Depois de praticamente 6 meses de incertezas e muitas perdas trágicas, é natural que o mundo se questione sobre como será a vida após coronavírus e até tema pelo futuro. Será que as coisas voltarão a ser como antes?

Como será a economia mundial? Será que a forma como adquirimos o nosso ganha pão será a mesma? Como serão nossas relações daqui pra frente? Será que vamos valorizar mais a presença das pessoas? Será que estaremos aqui?

Pin-Up Cigana do Universo Retrô
(Foto: Tainá Lossëhelin)

Talvez seja difícil saber o que esperar deste mundo pós-pandemia. Mas, o que podemos aprender com a cultura cigana é não perder a alegria, o sorriso no rosto, o apreço pela vida e a esperança que dias melhores virão naturalmente, apesar das possíveis adversidades pelo caminho.

Pois esse é o fluxo natural da estrada da vida. Como dizem, não há mal que dure para sempre. Essa fase difícil vai passar e vão nos restar apenas aprendizados e uma grande evolução, no final. E isso não precisa ser nenhum vidente para saber.

Gypsy Queen no Spotify

Na playlist Gypsy Queen, no Spotify do Universo Retrô, você encontra o melhor do Gypsy Jazz (Jazz Cigano), estilo que teve seu início com o gênio do violão Django Reinhardt na década de 1930.

Considerado um dos melhores e mais influentes guitarristas de todos os tempos, é tido como o pai do jazz na Europa. De ascendência cigana, Reinhardt nasceu na Bélgica e acompanhou sua caravana até chegar aos arredores de Paris, onde se tornou conhecido por sua música.

Ficha Técnica:

Produção: Daise Alves e Mirella Fonzar / Universo Retrô
Modelo: Mirella Fonzar (Miss De-Lovely)
Fotografia: Tainá Lossëhelin

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