Para muitos a loucura é apenas uma só. Se você não enxerga a realidade como ela é, você está louco. Se você age ou não se comporta conforme padrões pré-estabelecidos, também é considerado louco – em todas as suas variações comportamentais e patogênicas.
Aprisionadas em sua própria mente, as pessoas tidas como loucas até pouco tempo eram (e ainda são, em alguns lugares do mundo) trancafiadas em asilos, hospitais e manicômios com pouco ou nenhum tratamento adequado, muitas vezes desumano, que não raro terminavam por agravar seu estado de saúde. E foi a luta por um tratamento adequado e humanizado que moveu a vida da psiquiatra brasileira Nise da Silveira (1901-1999).
Ícone da medicina brasileira e a principal responsável pela introdução da psicoterapia como tratamento no país, agora ela tem sua história contada em “Nise – O Coração da Loucura”, que estreia nessa quinta-feira (21) em todo o país.
O filme acompanha o período em que Nise atuou como responsável pelo setor de terapia ocupacional do Hospital do Engenho de Dentro, no Rio de Janeiro (e que hoje leva seu nome). Admiradora do psiquiatra suíço Carl Gustav Jung, que defendia o tratamento através da imagem.
E é com a ajuda da tinta, do pincel e do barro, além de carinho e paciência, que a médica e sua equipe conseguem se conectar com os pacientes (chamados por ela de clientes, pois considerava que – sendo uma servidora pública – ela estava prestando um serviço a eles. Os pacientes, dizia, eram aqueles que os acompanhavam). Cinzento e triste no início, as cores começam a aparecer ao longo da história, conforme cada um dos “clientes” volta a se conectar com o mundo exterior.
O maior triunfo do da obra está em seu elenco. Glória Pires entrega uma personagem prática, dedicada e metódica, que diz apenas o necessário diante dos “clientes” pelos quais nutre um amor quase maternal (“Não fale, apenas ouça e observe”, é o mantra que ela repete para sua equipe), mas que ao mesmo tempo não tem medo de enfrentar o machismo e o descaso dos colegas de profissão ao questionar sem medo seus métodos e práticas. Mas Glória não brilha sozinha. Todo o elenco traz atuações marcantes e emocionantes, com destaque para os esquizofrênicos de Claudio Jaborandy (Emygidio) e Roney Villela (Lucio).
Outro ponto forte do filme está no fato do diretor Roberto Berliner não subestimar a inteligência do espectador. Apenas alguém mais curioso saberia de fatos como Nise ter sido a única mulher em sua turma na Universidade de Medicina da Bahia, ou que ela foi presa pela polícia de Getúlio Vargas por participar da Intentona Comunista, ou até mesmo que Ivone, a enfermeira que a auxilia no tratamento dos pacientes, viria a se tornar Dona Ivone Lara no futuro.
Sai o didatismo histórico e entram cenas de eletrochoque, descrições de lobotomia, animais mortos e imundice. Para o diretor, esses detalhes são apenas uma nota de rodapé numa história muito maior, real e interessante de ser contada. Uma história sobre o poder da arte sobre a miséria humana.
O filme, que se passa na metade do século XX, tem toda uma estética retrô com cenários e figurinos do Brasil de antigamente. Assista o vídeo abaixo:
Para acompanhar novidades do filme, acompanhe a página aqui.