Recentemente o Universo Retrô completou 9 anos em atividade e, como de costume, nós, editoras, protagonizamos editoriais especiais para celebrar mais um aniversário da plataforma. Após explorar diversos temas ao longo dos anos (como a Mulher Selvagem e a Futurista, em 2023), chegou a hora de trazer algo mais glamouroso e repleto de feminilidade, ainda atrelado à nossa essência vintage e inspirado pela cultura popular brasileira.
Começamos as comemorações deste ano com uma homenagem às Vedetes Brasileiras, estrelada por Miss Daisy para o Pin-Up do Mês de Julho, e, agora, buscamos inspiração nas Cantoras de Rádio para o Pin-Up do Mês de Agosto. Intitulada “Rainha do Rádio”, a nova produção original do Universo Retrô Produções, protagonizada por mim, Miss De-Lovely, revisita a época em que esse meio de comunicação dominava a cultura de massa e as grandes vozes femininas ecoavam pelo imaginário popular.
Entre os anos 1930 e o início da década de 1960, divas como Dalva de Oliveira, Emilinha Borba, Carmen Miranda, Ângela Maria, Elizeth Cardoso, Linda Batista, entre outras, entravam diariamente na casa de milhares de brasileiros com suas icônicas canções, que se tornaram trilha sonora de toda uma geração.
Com performances emocionantes e aquele sotaque com o “R” bem característico dessa época, seus repertórios eram bastante variados e iam dos animados sambas, choros e marchinhas de carnaval aos dramáticos boleros, sambas-canções e serestas. Algumas delas também introduziram o rock ‘n roll americano, o jazz e plantaram a sementinha da Bossa Nova, além de fazerem versões de clássicos internacionais.
Neste editorial repleto de referências – entre figurinos marcantes e poses que lembram as capas de discos de vinil, fotos de revistas e cenários que nos remetem aos estúdios de gravação da época – convidamos você, leitor, a celebrar o legado dessas incríveis divas, através de uma experiência multissensorial, que une fotografia Pin-Up, história e música. Vem com a gente mergulhar no universo mágico da Era de Ouro da Rádio e toda a graça e glamour dessas cantoras “Made In Brazil“!
Rainha do Rádio: Uma produção original Universo Retrô Produções
A parceria com Taína Medeiros e sua equipe
Os editoriais Vedete Brasileira e Rainha do Rádio marcam o primeiro ano de trabalho do Universo Retrô Produções em parceria com a fotógrafa Taína Medeiros. Clicados em fundo infinito colorido, ambos ensaios foram realizados no Eventual Estúdio, localizado em um casarão no Brooklin, em São Paulo. O espaço fotográfico idealizado por Taína, além de contar com mais de 300 metros quadrados e diversos cenários vintage, possui um estúdio clássico completo com mais de 15 opções de fundo fotográfico, o que nos permitiu a criação de ambientes minimalistas e monocromáticos.
Um editorial monocromático e minimalista
Enquanto o ensaio inspirado nas Vedetes aposta em tons de rosa, com o objetivo de traduzir a alegria e o glamour dos espetáculos do Teatro de Revista, a produção de Rainha do Rádio mirou em cores como lavanda, lilás, violeta, roxo e magenta. Não por acaso, a escolha dessa paleta, suave e ao mesmo tempo poderosa, ajuda a reforçar o clima de glamour e mistério dessas estrelas, já que são tons que transmitem delicadeza, sensibilidade, magia, sofisticação e ainda são ligadas à realeza.
Captando a alegria e melancolia das cantoras
Para capturar a essência dual dessas divas do passado, que ora traziam canções alegres e engraçadas, ora extremamente dramáticas e melancólicas, apostamos em um editorial dividido em dois moods.
O primeiro, mais dramático, traz luzes de espetáculo e um figurino glamouroso e romântico, em referência às performances dessas divas e sua participação em festas e eventos formais, como o concurso Rainha do Rádio. No cenário, apenas um spot de luz de espetáculo e um microfone retrô.
Já o segundo, com figurino mais sensual e alegre, apresenta uma atmosfera de diversão e tropicalidade. O rádio da década de 1940, do acervo da Boutique Vintage Brechó, é o ponto central deste cenário, fazendo um contraponto de cor nessas fotos.
Cenários minimalistas e itens essenciais
A proposta de dividir “Rainha da Rádio” em duas partes foi também criar dois ambientes distintos, sendo um que remetesse aos estúdios de rádio do passado – onde muitos, inclusive, eram abertos ao público com programas de auditório e apresentações musicais ao vivo.
Já o outro a ideia era trazer uma atmosfera contemplativa, com o ato de ouvir rádio em casa, já que esse era o principal meio de comunicação de massa no Brasil até os anos 1950 e o tema central do editorial. Apostamos também em cliques com discos de vinil e poses típicas das revistas especializadas da época.
Figurino inspirado na moda dos anos 1950
Além de ter tudo a ver com o estilo Pin-Up, os figurinos utilizados neste ensaio reforçam a moda em voga na década em que o rádio atingiu seu auge, os anos 1950. Durante essa época, além de cativar o público com suas vozes encantadoras, as cantoras influenciavam a maneira como mulheres comuns se vestiam por meio das revistas. Portanto, optamos por vestidos que remetessem ao estilo deste período – que, por sua vez, também foi muito inspirado na moda das atrizes da Old Hollywood.
O glamour e romantismo do vestido lilás godê
Para o primeiro figurino, apostamos num modelo vintage com tecido acetinado lilás e corte clássico – godê midi, com cintura marcada e decote ombro a ombro. Para arrematar, colar e brincos de pérolas, estola de pele (sintética) off-white e luvas longas também em lilás.
O uso de cores suaves e os acessórios delicados são típicos do estilo romântico, frequentemente adotado por divas como Emilinha Borba, Dircinha e Linda Batista naquela época. Essa estética era geralmente inspirada por estrelas de cinema internacionais como Rita Hayworth, Grace Kelly e Ava Gardner.
O ar tropical e alegre do vestido lápis com flores
Já para o segundo figurino, optamos por trazer algo mais sensual, com vestido justo midi, também lilás, decote e alça cruzada no pescoço (halter neck), um clássico que nasceu nos anos 1940 e se tornou ainda mais popular na década de 1950. Para arrematar, orquídeas magenta e lilás nos cabelos e em formato de broche.
O uso de flores e acessórios de cabelo era uma assinatura de muitas cantoras da época, que combinavam sensualidade com um ar de inocência; é o caso de Carmen Miranda e sua irmã Aurora Miranda, e das cantoras Elizeth Cardoso e Dalva de Oliveira.
Maquiagem e cabelo típicos dos anos 1950
Para completar o visual, apostamos em um penteado retrô ondulado solto, algo bastante visto entre as divas deste período. A maquiagem, assinada por Marina Assumpção Neiva, também remete à moda dos anos 1950 com a clássica junção de batom vermelho, delineador preto, cílios postiços e pele com acabamento opaco.
De 1930 a 1950: A evolução do rádio ao longo das décadas
Você deve estar se perguntando: por que ressaltamos tanto a década de 1950 neste editorial, se a consolidação do rádio teve início a partir dos anos 1930 e já haviam muitos artistas em voga nessa época? Carmen Miranda, por exemplo, conhecida por ganhar Hollywood com sua irreverência, estilo peculiar e voz inconfundível, iniciou sua carreira no rádio na década de 30.
No entanto, apesar da popularidade de algumas cantoras como Carmen, sua irmã Aurora Miranda e Aracy de Almeida, este ainda era um período com destaques majoritariamente masculinos no universo musical, com nomes como Francisco Alves, Mário Reis, Orlando Silva e Nelson Gonçalves. Foi somente nos anos 1950 que a idolatria pelas cantoras de rádio tomou outra proporção.
A popularização das revistas especializadas
Se antes a aproximação do público com a artista só era possível ao vivo, frequentando as emissoras ou indo a shows, com o surgimento das diversas revistas especializadas aumentaram-se as possibilidades de contato com o mundo do rádio. Com os registros dessas artistas por meio de fotografias e reportagens, o público passou a ter também interesse na intimidade delas; seus rostos, o que vestiam, o que pensavam etc.
A partir deste período, não só a voz marcante e o talento das cantoras importava, elas passaram a ser consideradas símbolos de elegância e sofisticação, influenciando a moda e os costumes da época em suas aparições em revistas como Fon-Fon!, Cinelândia, Radiolândia, O Cruzeiro e Revista do Rádio, famosa, inclusive, por ajudar a popularizar o famoso concurso Rainha do Rádio.
As Rainhas do Rádio: Afinal, quem eram elas?
Além do título deste editorial – que não leva o nome de Rainha do Rádio por acaso, não poderíamos deixar de apresentar outra parte importante da história dessas divas neste ensaio fotográfico. Com cliques que trazem coroa, faixa e buquê de flores, ilustramos o concurso mais famoso da Era de Ouro da Rádio: Rainha do Rádio.
Com início no final da década de 1930, impulsionado pelas próprias emissoras de rádio que queriam promover suas artistas, essas competições se tornaram eventos bastante populares até a década de 1950, nos quais o público passou a votar por meio da Revista do Rádio e coroar sua favorita como Rainha. O concurso era uma espécie de Oscar das cantoras brasileiras e ajudava a firmar o reconhecimento e a popularidade de uma artista.
As irmãs Dircinha e Linda Batista dominaram o concurso
Com mais de duas décadas de duração, o concurso elegeu nomes como as irmãs Linda Batista (1936 – 1947) e Dircinha Batista (1948), que, juntas, passaram mais de uma década no trono; Marlene (1949 – 1950), Dalva de Oliveira (1951), Mary Gonçalves (1952), Emilinha Borba (1953), Ângela Maria (1954), Vera Lúcia (1955), Dóris Monteiro (1956 – 1957) e, por último, Julie Joy (1958), já num estilo mais americanizado, cantando versões de músicas em inglês.
A disputa entre Marlene x Emilinha Borba
Uma das histórias mais famosas envolvendo o concurso envolve as cantoras Marlene e Emilinha. Eternas rivais, elas disputaram o título várias vezes, gerando uma polarização imensa entre seus fãs que, acredite ou não, dividiu o Brasil na época. De um lado, a doce e simpática Emilinha; do outro, Marlene, com sua ousadia e potência vocal. As duas representavam dois lados de uma mesma moeda: a paixão do público brasileiro pela rádio.
A importância e força do Rádio até os anos 1960
Se hoje o rádio representa uma distração para motoristas e pessoas que querem se informar enquanto se movimentam, na primeira metade do século XX a portabilidade era zero e o foco outro. Entre os anos 30 até o início da década de 1960, ouvir rádio era uma atividade a se fazer em grupo, geralmente na sala de seus lares, ao redor de grandes aparelhos valvulados.
Na programação, era possível curtir programas de auditório com apresentadores carismáticos, emocionantes radionovelas, programas de calouros, humor, além dos tradicionais concursos de rainha e rei do rádio, citados anteriormente. Entre os programas mais populares estavam os de calouros, que foram os primeiros a dar visibilidade a ícones como Doris Monteiro, Ângela Maria e Emilinha Borba.
Descobrindo talentos
Um dos concursos de calouros mais emblemáticos foi o “Programa do Ary Barroso”, apresentado por um dos mais influentes compositores da época. Ary ficou famoso por seu estilo irreverente e brincadeiras ácidas com candidatos que não lhe agradavam. Outro nome importante foi o “Programa de Calouros” de Silvio Santos, que começou no rádio e mais tarde migrou para a televisão.
Além de entreter as famílias, a democratização do rádio foi responsável pela transição entre a música erudita para a popular e por abrir portas para inúmeros artistas; entre cantores, apresentadores, atores, comediantes e produtores, que posteriormente viriam a fazer sucesso na televisão e no cinema, anos mais tarde.
Surgimento da Televisão: O declínio da Rádio
As décadas de 1950 e 1960 viram surgir uma competição “desleal” com a chegada da televisão e uma transição significativa na história da comunicação de massa no Brasil. A introdução da televisão aconteceu em 1950 com o lançamento da TV Tupi (que também começou como uma emissora da Rádio), mas sua popularização só foi realmente acontecer na década de 1960, com a diminuição do valor dos aparelhos e expansão da rede elétrica no país.
Com a nova dinâmica de entretenimento, o rádio começou a perder sua posição de liderança e acabou se vendo obrigado a se reformular. Com a migração de programas de auditório para a televisão e o surgimento das telenovelas, as emissoras de rádio passaram, ao longo dos anos, a investir mais em formatos que não dependiam de imagem, como programas de música, talk shows e notícias, levando ao fim da Era de Ouro da Rádio.
Alguns artistas que começaram suas carreiras no rádio migraram para a televisão, como as atrizes Arlete Salles e Laura Cardoso, os apresentadores Silvio Santos e Ary Barroso, o humorista Chico Anysio, além de nomes como Hebe Camargo, que se tornou uma das maiores apresentadoras da televisão brasileira.
Apesar de algumas das cantoras ganharem espaço para divulgar sua música também na televisão, muitas das estrelas do rádio não conseguiram transitar de um meio para o outro. O mundo mudava rápido, e a música acompanhava, fazendo surgir novos artistas e estilos, inclusive a Bossa Nova, a Jovem Guarda e a Tropicália. O que restou foi saudades e grandes canções de uma era repleta de talentos.
Ouça a seguir nossa playlist com os sucessos da época!
Ficha Técnica
Modelo: Miss De-Lovely
Fotografia: Taína Medeiros
Edição: Lucas Simões
Produção executiva: Daise Alves | Universo Retrô Produções
Estúdio: Eventual Estúdio
Figurino: Acervo Universo Retrô e Lovely Vintage Store
Maquiagem: Marina Assumpção Neiva
Cabelo: Mirella Fonzar
Apoio: Brechó Boutique Vintage (Rádio) e Leo Rocker And The Old Boys