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Ziraldo: relembre a trajetória do “pai” do Menino Maluquinho

8 de abril de 2024, por Leila Benedetti
Lifestyle
Ziraldo

Foto da Capa: Divulgação/Cidade Verde

Perdemos mais um ícone da cultura pop brasileira neste último sábado (6), Ziraldo. Famoso por criar personagens como Supermãe, Mineirinho e, principalmente, o Menino Maluquinho, o cartunista morreu aos 91 anos em sua casa no Rio de Janeiro. 

Início

Nascido no interior de Minas Gerais em 1932, Ziraldo já havia manifestado seu talento para o desenho aos 6 anos de idade ao publicar um desenho para o jornal Folha de Minas. Mas, aos seus vinte e poucos anos, em 1954, se formou em Direito pela UFMG. Apesar da formação, virou colunista de humor para a Folha da Manhã (atual Folha de S.Paulo). Já em 1957 ele começou a criar charges para O Cruzeiro e, em 1963, para o Jornal do Brasil, onde personagens famosos como Jeremias – o Bom surgiram e logo conquistaram o público. 

O cartunista também foi pioneiro em lançar a primeira revista em quadrinhos de único autor com a Turma do Pererê em 1960, que também foi a primeira HQ a cores produzida totalmente no Brasil. Entretanto, essa obra foi cancelada em 1964 com a chegada do regime militar no país e só foi relançada nos anos 70 pela Editora Abril, mas sem o sucesso inicial, além de outras reedições posteriores nos anos 80 e 90. 

Jeremias, o Bom
(Jeremias, o Bom, um dos sucessos de Ziraldo publicado nos anos 60, criticava os “bons costumes” da sociedade brasileira da época. | Arte: Ziraldo/Jornal do Brasil)

Ziraldo e a Ditadura Militar

Assim como todo artista brasileiro de meados do século XX, Ziraldo também se viu desafiado pelo governo militar da época. Suas habituais charges publicadas no Jornal do Brasil e no Cruzeiro ganharam tons de protesto e passaram a criticar o governo logo após o golpe de 1964, o que tornou o cartunista uma das principais vozes na resistência ao autoritarismo e à opressão dos militares. 

A coisa complicou quando, em 1968, o governo implementou o AI-5, que marcou o momento mais repressivo da ditadura. Foi neste período, mais especificamente em dezembro daquele ano, que Ziraldo foi preso pela primeira vez. Isso deu incentivo para que, em 1969 e já fora da prisão, fundasse, juntamente com os jornalistas Tarso de Castro, Sérgio Cabral e Zélio Alves Pinto, este último também seu irmão, O Pasquim, um tabloide humorístico que fazia oposição ao então governo e um marco na história da contracultura brasileira. 

O Pasquim
(Ziraldo foi um dos fundadores do icônico tabloide O Pasquim. | Arte: Ziraldo/O Pasquim)

Por conta da criação de O Pasquim, Ziraldo e quase toda a equipe do tabloide foram detidos outra vez em 1970. “Ter podido atravessar os anos de chumbo fazendo O Pasquim foi uma dádiva. Morríamos de medo, mas fazíamos de tudo”, declarou o cartunista em uma entrevista para a Folha de S.Paulo em 2007. 

Em 2008, Ziraldo e mais outros 20 jornalistas perseguidos pela ditadura receberam uma indenização do Estado no valor de R$1 milhão, além de pensão vitalícia de cerca de R$4 mil. Alguns de seus ex-companheiros de protesto criticaram a aceitação do ato, mas o cartunista rebateu dizendo que “o Brasil lhe devia” aquela indenização.  

O Menino Maluquinho

Nos anos 80, Ziraldo incluiu o público infantil em sua carreira e lançou o seu maior sucesso editorial, o livro O Menino Maluquinho. Ao longo dos anos essa obra virou uma franquia, com adaptações para TV e cinema, além de HQs e peças teatrais. 

De acordo com o cartunista, ele reconhecia o sucesso de O Menino Maluquinho, mas via como algo cult, sendo um caso oposto da Turma da Mônica, de Maurício de Sousa, que tem mais repercussão a ponto de atravessar gerações. O enredo da obra infantil de Ziraldo obviamente tem humor ingênuo, mas, com linguagem apropriada, aborda questões sociais como feminismo, ecologia, autoritarismo (sendo o pai e o avô de um dos personagens dois militares), entre outras. A maioria dos personagens, apesar de crianças, são inteligentes, estudiosas e preocupadas com questões globais. 

O Menino Maluquinho
(O Menino Maluquinho, lançado como livro em 1980, foi o maior sucesso de Ziraldo e se até se tornou franquia. | Arte: Ziraldo)

Prêmios e homenagens

Logo com poucos anos de carreira, em 1960, Ziraldo recebeu um Prêmio Nobel Internacional de Humor em Bruxelas, além do prêmio Merghantealler, a principal premiação da imprensa livre da América Latina. Já em 1980, recebeu o prêmio Jabuti de Literatura pelo livro de O Menino Maluquinho, além de mais três prêmios no decorrer dos anos 2000 – o italiano Andersen em 2004 pela sua obra Flicts, de 1969, um agraciamento anual pela Ordem do Mérito Cultural em 2005 e o Prêmio Ibero-Americano de Humor Gráfico em 2008. 

Décadas depois, ele foi homenageado duas vezes por escolas de samba. A primeira foi no carnaval de São Paulo em 2003 pela Nenê de Vila Matilde, já a segunda foi em 2012 na Sapucaí pela Tradição. Em 2016, fora da época de carnaval, ele recebeu a Medalha de Honra da UFMG em uma cerimônia presidida pelo reitor Jaime Arturo Ramírez, enquanto que, em 2018, foi homenageado na CCXP no palco Artists Alley.

Ziraldo
(Ziraldo sendo homenageado pela escola Tradição na Sapucaí em 2012. | Foto: André Chalabi/Casa Ziraldo de Cultura)

Problemas de saúde

Ziraldo andava já algum tempo com a saúde delicada. Em 2013, o cartunista sofreu um infarto leve durante uma viagem à Alemanha, que o levou a fazer um cateterismo. Já em 2018, sofreu um AVC, chegando a ficar internado em estado grave, e, em 2012, sofreu mais dois AVCs, debilitando sua saúde e aparecendo em público com menos frequência. Nos últimos meses, o cartunista passava a maior parte do tempo acamado e se alimentando por sonda. 

Segundo sua família, Ziraldo morreu na tarde de sábado enquanto dormia devido à falência múltipla dos órgãos. Seu velório foi aberto ao público e ocorreu entre a manhã e a tarde de domingo (7) no Museu de Arte Moderna, no Rio de Janeiro, com a presença de família, amigos, fãs, autoridades e artistas. Ao mesmo tempo em que ocorria a cerimônia, o Flamengo, seu time de coração, jogava com o Nova Iguaçu no Campeonato Carioca, no Maracanã. Os jogadores também prestaram homenagem dentro do campo.  

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