No próximo sábado (11), acontece o Mods Mayday, evento dedicado a subcultura mod que contará com o lançamento do livro Nós Somos Mods do jornalista André Carmona, que contará a história da subcultura mod paulistana. O lançamento reunirá também quatro bandas de três gerações diferentes da cena paulistana: The Charts (90s), Efedrinas e Modulares (2000s) e Os Artefactos (2010s).
Para os apaixonados pelos anos 60 e que se identificam com o movimento mod, conversamos com André Carmona, autor do livro, para compreender como nasceu essa iniciativa, o seu desenvolvimento e os aspectos da cena mod ontem e hoje. Confira:
Universo Retrô – Como iniciou seu interesse pela subcultura mod?
André Carmona – Foi há dez anos, mais ou menos. Eu sempre gostei de subculturas, cresci no punk e no hardcore, mas, no começo da idade adulta, com uns 20 anos, eu sentia a necessidade de me abrir para outros gêneros. Queria experimentar outras sonoridades. E vinha adaptando meus ouvidos para isso. Era o começo da internet, das redes sociais, a vida cultural era acelerada. Os acervos digitais se expandiam, e eu baixei muita coisa. Baixo até hoje, mesmo com YouTube e streaming. Nessa época, escutei de tudo um pouco; bossa nova, indie, cumbia, entre outras coisas. Veio, então, a música jamaicana, depois o rock clássico, e o interesse foi crescendo cada vez mais.
Até que o lançamento do filme Quadrophenia, do The Who, em DVD, me permitiu um contato mais direto com o mod, com a estética. E eu me apaixonei por esse universo: a questão musical, a moda, a atitude e, principalmente, a premissa que rege a subcultura, que é a internacionalização dos elementos. Foi a primeira subcultura realmente internacional, que mesclou um pouco de tudo e parece não ter fronteiras. É difícil falar em bom gosto, mas o mod tem um pouco disso: cultuar, elegantemente, as artes em geral.
Universo Retrô – Nos próximos dias você lançará o livro “Nós Somos Mods”, acredita que o fato de ser apaixonado por essa subcultura o ajudou a compor o livro? O que o inspirou a escrevê-lo?
André Carmona – Com certeza. Tudo começa com a paixão despertada. Depois, quando eu passei a pesquisar mais a fundo sobre o tema, senti muita dificuldade quanto à bibliografia disponível. Não tem praticamente nada em português. Alguns blogs, como o “A Cena”, do curitibano André, e o “Moderno Mundo”, da gaúcha Penny Lane, foram e são muito inspiradores, além de confiáveis.
Mas basicamente está tudo muito restrito ao movimento gringo. Quando o assunto envolve as bandas brasileiras, então, as lacunas são grandes demais. O motivo de me dedicar ao mod paulistano se resume à curiosidade pessoal em relação a esses personagens que fazem parte da nossa cultura musical, porém, pela falta de uma cobertura mais específica, permanecem obscuros.
Universo Retrô – Como está sendo o processo de produção do livro? Desde a concepção, até agora, o momento de divulgação?
Universo Retrô – Depois da decisão de escrever o livro, o processo, da pesquisa até a redação, demorou um ano. Fiz um levantamento inicial de tudo (ou quase tudo) que poderia ter sido relacionado à estética mod no Brasil. Por questões editorias, decidi me limitar à cena paulistana. Definida a estrutura do livro, passei para as entrevistas, às quais dediquei três meses. Outros dois foram gastos com a redação, a revisão e, paralelamente, o projeto gráfico.
A divulgação acabou acontecendo de forma orgânica. O primeiro a ler um exemplar da edição experimental foi o Sandro Garcia, baixista do The Charts, grande banda do mod brasileiro. E ele curtiu muito. Daí foi um passo para o público da banda começar a mostrar interesse pelo trabalho, que resultou na minha participação no festival Mods Mayday 2017, no próximo sábado, dia 11 de fevereiro. Lá, acontecerá o lançamento oficial do livro.
Universo Retrô – Esse é um livro produzido de forma independente. Quais caminhos você está seguindo para atingir um público além da subcultura mod?
André Carmona – O livro foi produzido de forma totalmente independente. E essa é uma pergunta interessante. Pois tive uma surpresa. Sempre foi uma questão latente: devo tentar atingir um público além da subcultura e como fazer isso? A começar pelo drama de explicar o que é mod para o público leigo, já que a “entidade” funciona muito mais como uma percepção, algo imaterial, do que como um conceito fechado. Mas, bem no início da repercussão no Facebook, notei que praticamente metade do público que vinha me procurar não pertencia à subcultura mod, ou qualquer outra expressão.
Ao contrário, são pessoas interessadas única e exclusivamente por música. Isso é muito, muito massa. Após o lançamento, minha intenção é conseguir parcerias com espaços culturais (que já existem em São Paulo) para continuar difundindo o volume a um público mais abrangente, que pode partir do interesse pelo rock em geral, sem distinções de gêneros, até chegar a uma galera que curte boas histórias, de gente de verdade, o bom e velho jornalismo. É um desafio.
Universo Retrô – Quem comprar o seu livro que tipo de conteúdo encontrará?
André Carmona – Esse foi o segundo, e talvez o maior, desafio do livro: definir se eu falaria sobre mod para um público de iniciados ou de leigos no assunto. Sem querer soar pretensioso, tentei mesclar as duas coisas. Uma das soluções encontradas foi produzir um encarte que traça um panorama geral da cultura na Inglaterra, de forma bem didática. Conforme avançamos na narrativa, eu e a Lara Hax (designer responsável pelo projeto gráfico) decidimos, gradualmente, inserir elementos mais particulares do fenômeno no Brasil.
Ao todo, são seis histórias, que trazem diferentes momentos e percepções do mod a partir do ponto de vista de protagonistas, respeitando sempre a cronologia. Optei, também, por não incluir tantos personagens em detrimento da profundidade. O livro abre com um capítulo totalmente ilustrado que contextualiza a atmosfera da cidade de São Paulo na época do “surgimento” do mod.
Depois, passamos a reportagens com Edgard Scandurra, as bandas Faces e Fases e The Charts, a pesquisadora Amarilis Gibeli e os músicos Walter Chinaski e Caetano Sevilla. Não tenho pretensão alguma de definir a cena, já que tudo está em constante evolução. Dessa maneira, me propus a fazer um recorte introdutório do movimento.
Universo Retrô – Como está a cena MOD hoje no Brasil e no mundo?
André Carmona – Em um dos capítulos do livro, o Walter Chinaski, ex-vocalista do Laboratório SP, dá um depoimento bem interessante sobre o assunto, já que hoje ele vive em Londres. Lá, o mod é um referencial cultural importante, que transpassou a barreira do tempo e se faz presente até hoje como inspiração na moda, na música e em outros campos da arte e da vida cotidiana. Mesmo que uma banda, por exemplo, não se assuma como mod, ela carrega uma espécie de DNA gritante, uma referência indissociável.
No Brasil, apesar das idas e vindas, a cena tem se mostrado resistente. O festival Mods Mayday é uma prova disso. Vai funcionar como um encontro de gerações, inclusive com a volta do Charts. Além da festa, é preciso citar o Modulares, a banda mais atuante nos últimos dez anos, a caçula Os Artefactos, que vem surpreendendo com um r&b vigoroso, entre outros agentes culturais, que divulgam o mod com consistência, à sua maneira.
Universo Retrô – A origem da subcultura mod está muito atrelada à coisas modernas. Mas hoje vemos o mod muito como cultura do revival. Como está essa mescla entre passado, presente e futuro dentro da cena mod?
André Carmona – Acho que tudo passa por releituras. As bandas mods inglesas dos anos 60 iniciaram fazendo releituras do r&b americano, para depois se desprender e criar algo com identidade. Ou seja, o processo é natural, esse é o eterno Big Bang dos fenômenos culturais, uma geração tentando copiar a outra e, nesse esforço de fazê-lo, acaba parindo algo totalmente novo, diferente. De qualquer maneira, acredito que a estética mod ainda é muito atual.
No livro, toco no assunto com Edgard Scandurra. E ele acredita que o mod não necessariamente tem a ver com algo preso aos anos 60 – por exemplo, considera o projeto Benzina, no qual faz experimentações com música eletrônica, como algo muito mod. A discussão é ampla. E meu pensamento segue pela mesma linha. O mod é uma busca incansável pela estética perfeita, por atingir um bom gosto essencial em tudo e sob qualquer circunstância. Definitivamente, não há ideia melhor que a de Pete Meaden para resumir o lance todo.
Universo Retrô – Quem quiser saber mais sobre essa subcultura. Por onde deve começar?
André Carmona – Existem diversos caminhos. Tem coisas pra ouvir, outras para assistir e outras para ler. Mas começar por The Who é uma boa estratégia. Tanto os discos (um deles pode ser “My Generation”), quanto o clássico filme “Quadrophenia” foram portas de entrada para muitos entusiastas. Se quiser seguir desbravando pelos anos 60, certamente o leitor cairá em The Small Faces, The Kinks, The Artwoods, na psicodelia e numa outra porção de bandas e linhas diferentes.
Depois, tem a mod revival, quando o punk rock da icônica The Jam, nos anos 70, adotou o estilo. Também é discografia imprescindível. É preciso dizer que, na gringa, há uma série de ótimos livros sobre o assunto. The A to Z of Mod, dos jornalistas Paolo Hewitt and Mark Baxter, é um exemplo. A obra é praticamente uma enciclopédia, abordando temas mais específicos do mod, como personagens famosos, gêneros musicais obscuros, explanações sobre o vestuário e as tendências da moda, enfim, um monte de informação bacana.
No Brasil, além das diversas bandas, existem canais na internet, no Facebook, e os já citados blogs. O Nós Somos os Mods é o primeiro documento impresso a retratar a realidade tupiniquim. Espero que o público goste, e também que outras pesquisas possam vir a complementar o trabalho, na intenção de fortalecer a cultura e suas expressões; shows, festas, bandas e eventos correlacionados.
Universo Retrô – Historicamente há uma relação de intrigas entre os mods e os rockers. Como você enxerga isso hoje?
André Carmona – Ótima pergunta. Acho que a rivalidade entre subculturas juvenis até é normal e algo muito próprio da idade. Mas tem que ficar por aí. Quando estamos tratando de culturas importadas, é sempre bom ressaltar que o contexto, tanto geográfico quanto temporal, não pode ser simplesmente transplantado, uma vez que nossa realidade é diferente.
Ou seja, uma lógica construída na Inglaterra não necessariamente tem que fazer, em grande parte não faz, sentido aqui. São outros tempos, outros lugares.Para mim, os aspectos mais interessantes das subculturas residem na música, no compartilhamento de experiências e referências, não importando muito o gênero ou o visual. Seja quem você quiser. Escute o que você quiser. Viva seu próprio modo de vida, só não atrase a vida de ninguém.
Universo Retrô – Por fim, como podemos adquirir seu livro?
André Carmona – No próximo sábado, dia 11 de fevereiro, lançarei o livro no festival Mods Mayday 2017. Este será o primeiro contato do público com a pesquisa. Estou bastante ansioso. Depois, venderei os exemplares restantes, edição limitada, por e-mail, enviando a todo país, através do: nossomososmods@gmail.com. Muito obrigado pelo espaço. E mantenham a fé.
SERVIÇO
Festa Mods MayDay
Lançamento “Nós Somos os Mods” de André Carmona
Shows: The Charts, Modulares, Efedrinas, Os Artefactos
DJs: Kalota e Cintia Sixtie.
Local: Morfeus Club (Rua Ana Cintra, 110 – Santa Cecília, São Paulo/SP_
Hora e data: 16h, dia 11/02/2017 (sábado)
Entrada: R$ 20,00 com nome na lista (modsmaydaysp@gmail.com), R$ 25,00 na porta