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Adé Dudu: as quatro décadas do Grupo de Negros Homossexuais celebrados pelo MAB

3 de julho de 2024, por Leila Benedetti
Lifestyle
Adé Dudu

Foto da capa: Euvaldo Macedo Filho/ Acervo: Cultne/Google Arts & Culture

Todo dia 28 de junho é celebrado o Dia do Orgulho LGBT+ com vários eventos por centros de grandes cidades. Essa causa visa quebrar o preconceito contra os não-héteros, isso é, sim, de extrema importância, mas vale ressaltar a importância dobrada em lutar pelos direitos dos negros LGBT+, que foi conscientizada graças ao Adé Dudu, que, aliás, foi homenageado pelo Museu Afro-Brasileiro e pela plataforma BATEKOO com a oficina gratuita Ocupação Adé Dudu nos últimos dias 28 e 29.

O Adé Dudu era um grupo social originado em Salvador (BA). Este visava dar maior visibilidade a essas pessoas que, além de passar por diversas situações homofóbicas, também sofria com o racismo. Seu nome veio do iorubá, traduzindo livremente para o português brasileiro como “negro homossexual”. 

Pré-fundação do Adé Dudu

Sua fundação oficial é datada no dia 14 de março de 1981, mas já em 1978 algumas pessoas que sofriam o duplo preconceito foram se posicionando e abrindo caminhos para que membros do Movimento Negro Unificado e membros do Movimento Homossexual Brasileiro se unissem para debater o problema em questão. Dessa discussão, surgiram publicações sobre o assunto no tabloide homossexual Lampião da Esquina, atraindo muitos leitores que, mais tarde, seriam integrantes do Adé Dudu. 

Mas a necessidade de uma manifestação real foi evidenciada pela primeira vez na edição nº4 de 1979 do jornal anarquista O Inimigo do Rei. Sua capa ilustrava em letras garrafais a manchete “Além de Preto, Bicha!”, evidenciando a profunda discriminação social e convidando seus leitores a se organizar politicamente. 

Além de Preto, Bicha!
(Icônica edição nº4 do jornal O Inimigo do Rei, lançada em 1979. | Acervo: CEDAP/Unesp – Assis/Cultne/Google Arts and Culture)

O autor por trás da matéria da capa era o estudante de jornalismo da UFBA Hamilton Vieira e a expressão destacada no artigo veio de um depoimento do bailarino Dionisius Filho (Nega Fulô). Ambos se envolveram no grupo de alguma forma quando este foi criado – Dionisius foi um dos fundadores e Hamilton se tornou integrante pouco tempo depois.

Com a publicação, os homossexuais negros de São Paulo, antigos integrantes do grupo Somos, fundaram, em 1980, o Grupo de Negros Homossexuais de São Paulo. Este atuou de forma autônoma em relação a outras organizações e durou apenas nove meses. Mas logo em seguida, o Adé Dudu foi fundado destacando a necessidade de discutir suas próprias questões e se organizar para trabalhar em conjunto com outras pessoas e grupos de homossexuais, negros, mulheres e setores populares. 

Grupo Somos
(Grupo Somos em manifestação organizada pelo MNU . | Acervo: James Green/Google Arts & Culture)

Os fundadores e a primeira atividade do grupo

Além de Dionisius, outros ativistas que fundaram o Adé Dudu foram Antônio Carlos Conceição, Ermeval da Hora, Ernani Filho, Evilásio Santos, Genildo Souza, Jorge Santos, Marco Argolo, Marcus Mahallia, Roquinho Sóstenes (Sostinho), Tosta Passarinho, Wilson Santana e Wilson Mandela. Todos eles vinham de experiências sociais distintas, como por exemplo, Wilson Mandela era economista e funcionário público, enquanto que Ermeval era operário de uma fábrica e Tosta Passarinho vivia de trabalhos temporários desde que voltou de um auto-exílio que o fez percorrer a América Latina nos anos 70. 

Sua primeira atividade foi uma pesquisa realizada entre março e setembro de 1981, visando entender melhor o perfil social, econômico e cultural dos negros homossexuais. A data para começar este estudo foi estrategicamente pensada, no caso, logo depois do feriado de Carnaval, época em que Salvador ficava lotada de pessoas deste grupo vindas de cidades menores próximas. Foram 102 entrevistas feitas em boates, praças, avenidas e praias, cujo resultados foram lançados como cartilha distribuída em novembro, durante as celebrações da Consciência Negra.

Pesquisa Adé Dudu
(Primeira pesquisa realizada pelo Adé Dudu em 1981. | Acervo: CEDOC LGBT+)

Fim e legado

Depois de passar a década de 80 atuando firmemente em congressos, realizando debates, fazendo parte de reuniões, entre outros feitos, o Adé Dudu se encerrou sem muito alarde em 1991. Seus membros seguiram rumos diferentes – Wilson Mandela concluiu o curso de Direito, se tornou integrante do Movimento Negro Unificado e entrou para a política partidária, enquanto que Ermeval se formou em Administração e Pedagogia, se tornou professor e vereador, além de ter entrado para a política educacional. 

Como herança do Adé Dudu, em 1995 foi fundado, também em Salvador, o Quimbanda-Dudu, um grupo de negros homossexuais ligados ao Grupo Gay da Bahia, atuando por uma década a favor dos direitos humanos e contra o racismo, machismo, homofobia e a epidemia do vírus HIV e Aids. 

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