Depois de protagonizar o editorial especial de Dia das Mães, abrindo as portas da minha casa e apresentando minha família, eu, Mirella Fonzar – editora do Universo Retrô, volto a posar ao lado do meu filho Martin para a série “Nas Nuvens”, da fotógrafa Ana Di Castro, em celebração ao Dia das Crianças.
Vestindo asas de anjo, meu menininho de 1 ano e 2 meses aparece ao lado da mamãe em um cenário que remete a um céu coberto de nuvens (só quem passa pela experiência com a Ana sabe a mágica que ela faz pra atingir esse resultado). Coincidentemente, o tema do ensaio não poderia ser mais propício, já que Martin dos Anjos Bueno Fonzar carrega o sobrenome paterno “Dos Anjos” em sua certidão.
Além das coincidências, cheguei à conclusão que a escolha do tema se deve à constante ligação que fazemos entre infância e pureza. Pra começar, durante muito tempo, os anjos serviram de modelos de representação das crianças no imaginário social. E assim como a maternidade, a infância ficou ligada ao ideal de pureza implícita nessas criaturas celestiais.
OS ANJOS, AS CRIANÇAS E A ARTE
A imagem da Virgem Maria com o menino Jesus em seu colo inspirou diversos artistas e ajudou a propagar a ideia de “infância santa” influenciada pelo Cristianismo. Além disso, na religião Católica, a devoção ao anjo da guarda foi reservada às crianças e até hoje muita gente acredita que esses seres são enviados para proteger os pequenos.
Um exemplo disso é o quadro renascentista Madona Sistina, do pintor italiano Rafael Sanzio, que traz a Madona (virgem Maria) segurando o menino Jesus em seus braços, enquanto querubins observam a cena, descansando em nuvens. Pintada em 1512, a figura destes anjos, inclusive, é representada por crianças.
Segundo relata um artigo publicado pela Fra Magazine, em 1912, Rafael teria se inspirado nos filhos de sua modelo, que observavam a obra sendo produzida, enquanto esperavam por sua mãe. A revista conta ainda que o artista, admirado com a postura das crianças, resolveu acrescentá-las na cena, exatamente como as viu.
Outra história, narrada no mesmo ano, na St. Nicholas Magazine, afirma que o italiano teria sido inspirado por duas crianças de rua “olhando tristemente para a janela de uma padaria.” Realmente, não se sabe ao certo se uma dessas histórias é verdadeira e a real origem dos tais anjos, apenas de que as figuras se tornaram bastante populares com o passar dos anos.
OS ANJOS, AS CRIANÇAS E AS QUESTÕES DE GÊNERO
Até o século 19, anjos como os de Rafael Sanzio eram retratados como seres espirituais sem gênero, algo exatamente oposto de como sempre foram vistas as crianças em grande parte do mundo. Apesar de estarem atreladas à inocência quase que angelical, já na primeira fase da vida, a sociedade sempre insistiu em ressaltar as diferenças entre meninos e meninos.
As cores, as brincadeiras, o corte de cabelo, as roupas, as expectativas sociais… entre pequenos detalhes está este abismo que separa pequenos homens de pequenas mulheres. É na primeira infância que essas distinções de gênero são impostas aos pequenos, que ainda estão abertos aos novos experimentos, mas nem sempre têm a chance de testar o que socialmente foi direcionado para o outro sexo.
Basta visitarmos uma loja de brinquedos neste Dia das Crianças. Muito provavelmente os corredores destinados a elas estarão repletos de itens cor de rosa, enquanto os deles se resumem aos tons de azul. Bonecas para meninas antes mesmo de saber se ela um dia virá a ser mãe. Carrinhos para meninos sem ao menos saber se serão, de fato, bons motoristas.
UMA PROPOSTA PARA O DIA DAS CRIANÇAS
Neste Dia das Crianças, proponho que a gente pense em nossos pequenos como verdadeiros anjos, sem levar em conta os gêneros que tanto os dividem, podam sua criatividade e os impedem de experimentar uma imensidão de possibilidades que a vida tem a oferecer.
Que tal incentivar seu menino a brincar de “comidinha”, quando ele se interessar pelas panelas da cozinha? Ou dar o carrinho que a sua garotinha tanto quer no lugar daquela boneca que todas têm? Nada disso vai diminuir sua criança, pelo contrário. Quem sabe você não está despertando em seu garoto um grande chefe de cozinha ou nela uma grande piloto de corrida.
Gosto de pensar em meu filho ou qualquer outra criança como um computador recém saído de fábrica, com HD fresquinho, cheio de espaço para novos arquivos – ou seja, com a cabeça livre de amarras sociais e pré-conceitos, pronto para descobrir seu espaço no mundo.
É durante a infância que a gente forma nosso caráter, descobre a nossa personalidade, nossos talentos e outras coisas que vamos carregar pro resto da vida. Cabe a nós, adultos, incentivar nossas crianças a ser quem elas quiserem ser a partir de então. O céu é o limite.