Desde que saí do show do cantor Les Greene, que aconteceu no último domingo, 20, como fechamento do Rock This Town Festival em São Paulo, tenho pensado no formato que adotaria para compor essa matéria do Universo Retrô. Apesar de geralmente não me expressar em primeira pessoa por aqui, dessa vez, sinto a extrema necessidade de lhes contar quão impactante foi essa apresentação; tanto para mim como para outros amantes do rock ‘n roll que passaram pelo Centro Esportivo Arthur Friedenreich.
Antes de mais nada, vou lhes contar como conheci Mr. Greene e quais foram minhas primeiras impressões sobre esse artista americano. Já havia ficado impactada com a voz de Little Richard no filme Elvis (Baz Luhrmann), mas, como muitos, ainda não fazia ideia de que a música “Tutti Frutti”, entoada pelo ator Alton Mason para o personagem era, na verdade, cantada por Les Greene.
Então, numa conversa despretensiosa com a amiga e amante dos anos 1950, Wendy Dorta, pedi por algumas indicações de novidades musicais. E ela me enviou um vídeo de Les Greene com a banda The Televisionaries, lançado pelo projeto Bobflix, no qual costumo acompanhar, mas, curiosamente, ainda não havia visto esse especificamente. Segundo Wendy, ele estava bombando lá fora nos festivais de cultura 1950’s.
Quando assisti, apesar da roupagem vintage (não a roupa, que fique claro, mas o formato musical rs), aquilo me soou contemporâneo, inédito, enérgico e extremamente bom. Ele era diferente. Confesso que a sensação que tive foi exatamente igual quando ouvi os grandes pela primeira vez, como Little Richard e Chuck Berry, lá na adolescência. Eu queria ouvir de novo, buscar outros vídeos dele, passar para outras pessoas a minha descoberta. Mostrei para o meu marido, minhas amigas. Simplesmente não conseguia parar de escutar – e ver.
Até que dentro de algumas semanas tive a feliz notícia que a Rockers In Brazil, de Monica Boop, traria Les Greene como uma das atrações internacionais do Rock This Town Festival em agosto, num evento gratuito. Passei a acompanhar Les nas redes sociais e a cada vídeo de performances dele em outros lugares, a expectativa para este show no Brasil só aumentava. Eu precisava ver de perto esse cara que me fez resgatar aquelas borboletas no estômago que tive lá no início.
Depois de um final de semana intenso com uma programação voltada à cultura dos anos 1950, como feirinha retrô, na qual tive a oportunidade de expor com minhas lojas (My Vintage Home, Lovely Vintage e Universo Retrô); concurso de Pin-Ups, onde fui uma das juradas; concurso de dança, no qual me arrisquei na pista, performances burlescas e shows de bandas incríveis de rockabilly e rock ‘n roll, as quais tive o prazer de acompanhar, como Pedrito & The Rockin Hunters, também uma grande aposta futura, e os britânicos do Furious, que trouxeram a energia da música Teddy Boy, finalmente a grande noite chegou.
Acompanhado pela orquestra Soul Boggie, não precisou de 1 minuto de show para Les Greene impressionar a plateia com seu poder vocal. Definitivamente não era um revival qualquer que nós, amantes da música vintage, estamos acostumados a ouvir. Apesar da maioria das canções serem velhas conhecidas nossas, estávamos tendo a oportunidade de conferir de perto algo inédito de um artista que já é muito grande em seu potencial, mas, sabemos que falta muito pouco para se tornar gigante e muito conhecido mundialmente.
Sabe quando nos filmes ou documentários de artistas como Elvis Presley e Chuck Berry mostram o catarse coletivo que essas lendas causavam na plateia durante suas apresentações? Foi exatamente assim no último domingo. Naquela noite, Les Greene, enquanto explorava cada cantinho do palco (e fora dele) e diversas extensões da sua voz, arrancou emoções intensas e inesperadas da audiência, com direito a lágrimas, gritos, pulos, sorrisos, reflexões e até um certo incômodo de quem não entendeu ainda a verdadeira essência transgressora do rock ‘n roll.
Dançamos loucamente aos sons de “Tutti Frutti” e “Long Tall Sally”, de Little Richard, e vimos nele muito de um dos primeiros artistas Queer que o mundo viu nascer. Assim como choramos copiosamente com sua versão de “If I Can Dream”, de Elvis Presley, e pudemos refletir sobre racismo, homofobia, sobre a origem do rock ‘n roll, a presença do preto neste estilo musical e a importância da representatividade no nosso meio. Tudo isso em poucos minutos de música, mas que com certeza impactaram eternamente em quem estava ali na plateia.
Além de clássicos como a balada “Can’t Help Falling In Love With You”, de Elvis Presley, os souls “You Can’t Hurry Love, das The Supremes e “Bring It to me”, de Sam Cooke, que levantaram o coro da plateia, Les Greene trouxe “Airbound”, canção que canta com os The Televisionaries, numa versão pra lá de interessante com os metais da Soul Boogie, que, diga-se de passagem, fizeram toda a diferença neste show no Brasil, mesmo com um único ensaio.
Num show que nos causou emoções extremas, ouvi frases como “eu nunca vi algo assim ao vivo”, “esse cara tem a essência dos meu ídolos do passado”, “isso é rock ‘n roll de verdade”, “não quero que essa noite acabe” e assim por diante. As pessoas estavam extasiadas, encantadas, em estado de graça, e naquele momento, as diferenças foram deixadas de lado, pois algo muito maior parecia estar nascendo ali – afinal, essa é a verdadeira essência do rock ‘n roll.
Nós que cultuamos ídolos do passado, por vezes, costumamos achar que o rock ‘n roll morreu com eles e que dificilmente nascerão astros e estrelas daquela grandeza. No entanto, quando temos a oportunidade de ver de perto talentos com a mesma entrega, energia e amor pela música que lendas que já não estão mais aqui, uma nova chama se acende e percebemos que a essência do rock continua viva e cheia de novas possibilidades.
Se o mundo colaborar e a indústria musical respeitar sua unicidade, Les Greene terá uma carreira brilhante pela frente, pois tem todos os requisitos que fazem de um músico uma lenda. Excêntrico, enérgico, expressivo, cheio de personalidade, com um poder vocal imenso e extremamente talentoso. Lindo, estiloso e carismático. Dança, canta, performa, encanta e representa. É clássico, mas ao mesmo tempo extremamente contemporâneo. Que prazer e honra ter feito parte da plateia de um artista deste gabarito!
Universo Retrô e Les Greene no MoniBoop Cast
Nesta terça-feira à noite, terei a oportunidade de participar do podcast de Monica Boop, MoniBoop Cast, ao lado de Les Greene. O programa vai ao ar nesta quarta, 23 de agosto, pelo canal do Youtube, aqui.