Home > Destaque > Daphne Oram, a revolucionária musicista britânica que inventou a música eletrônica

Daphne Oram, a revolucionária musicista britânica que inventou a música eletrônica

17 de março de 2023, por Leila Benedetti
Música
Daphne Oram

Ao contrário do que pensa o senso comum, a música eletrônica não surgiu com a Disco dos anos 70 e nem com a New Wave dos anos 80, sua história é datada um pouco antes. Desde o final dos anos 50 é possível ouvir algumas obras produzidas com equipamentos eletrônicos graças à Daphne Oram, compositora britânica e então gerente de estúdio da rádio BBC. Não era um estilo popular na época, mas muitos produtores de obras audiovisuais e peças teatrais sci-fi a procuravam para cuidar da trilha e dos efeitos sonoros. 

Nascida em 1925 no condado inglês de Wiltshire, Daphne teve seu contato com a música ainda na infância quando era aluna da Sherborne School for Girls, onde recebia aulas de piano, órgão e composição musical. Pulando no tempo para 1942, a então jovem recusou uma oferta de emprego na Royal College of Music para trabalhar na BBC como engenheira de estúdio júnior. 

Sua rotina no trabalho envolvia muito o gravador de fitas, pois, como era um período de guerras, a emissora podia ser atacada e a transmissão interrompida a qualquer momento. Portanto, Daphne tinha como uma de suas responsabilidades ir a concertos ao vivo para gravar as apresentações, cujo os registros iriam servir como um “tapa-buraco” da programação caso a rádio saísse do ar. 

BBC Radiophonic Workshop

Já no início dos anos 50, o período pós guerra, Daphne, agora promovida a gerente de estúdio e bem familiarizada com o gravador, viajou para os estúdios da RTF, em Paris, e descobriu a música concreta (hoje chamada de remixagem). Voltando para a BBC ela passou a se dar umas horas extras no serviço para explorar essa técnica, cortando, emendando e enrolando fitas, colocando-as em camadas, reproduzindo o que criava em várias velocidades, de trás para frente, entre muitas outras facetas. Aliás, tudo isso em parceria com seu colega de trabalho Desmon Briscoe.  

Com esses experimentos, ela se viu na necessidade de fazer uma campanha para que a BBC criasse um espaço no prédio da emissora dedicado apenas para a criação de músicas concretas. A emissora atendeu o seu pedido e, em 1958, nascia uma espécie de oficina chamada BBC Radiophonic Workshop

Tendo Daphne Oram como a primeira gerente de estúdio, a oficina trabalhava na criação de vinhetas e efeitos sonoros do tipo não apenas para a programação da rádio, como também para a do canal de televisão da emissora. Entre as produções que passaram pela oficina estão a série de ficção científica Quatermass and the Pit (1958-59) e a série de comédia radiofônica The Goon Show (1951-1960). 

Oramics

Apesar de concederem o espaço para criar a oficina, a BBC não valorizava muito a composição eletrônica. Esse fato frustrava Daphne e, em menos de um ano após a fundação do Workshop, a musicista se demitiu da emissora. Desligada da BBC em 1959, ela montou seu próprio estúdio focado na música eletrônica e lá criou uma nova técnica chamada Oramics, que, basicamente, era o som em forma de desenho. A técnica consistia em desenhar waveforms em uma película de 35mm, que era lida e transformada em som por células fotoelétricas, o resultado era um timbre muito semelhante aos dos posteriores videogames 8 bits.

Ainda trabalhando como compositora comercial, Daphne criou muitas trilhas não só para rádio e televisão, como também para peças teatrais, comerciais, instalações sonoras e exposições com a Oramics. Alguns de seus trabalhos envolvendo a técnica são o filme de terror The Innocents (1961), o concerto Four Aspects (1960) e óperas de Thea Musgrave e Ivor Walsworth. Além disso, o sucesso de sua Oramics foi tanto que até atraiu a atenção de Hollywood, o cinema norte-americano usou trilhas criadas por Daphne nos filmes de James Bond até Goldfinger (1964), no documentário Snow (1963) e no filme Rail (1967).  

Do analógico para o virtual

Com o forte avanço dos computadores nos anos 80, Daphne precisou se atualizar desenvolvendo uma versão software de sua Oramics. O primeiro computador a receber o aplicativo foi também um dos primeiros domésticos da história, o Acorn Archimedes. Ao longo dos anos, muitas desenvolvedoras lançaram versões mais modernas, mas sem o nome Oramics, visto que não eram fabricadas originalmente pela empresa de Daphne, portanto, essas versões passaram a ser chamadas apenas de sintetizadores. 

Uma versão original e mais atualizada só veio em 2011, quando o estúdio de Daphne e a Universidade de Londres fez parceria com a Apple e desenvolveu um app para iPhone e iPad. Hoje a antiga versão analógica da Oramics está exposta no Science Museum, em Londres, onde também se encontra a história de Daphne Oram e uma tela interativa em LCD com o app da Oramics instalado, onde o visitante pode criar músicas.   

Matérias Relacionadas
Live and Let Die
Live and Let Die: música de Paul McCartney é eleita a melhor trilha de 007
1990archives
1990archives: perfil no Instagram resgata a estética underground dos anos 90
A evolução de James Bond ao longo dos 50 anos da franquia 007
Conheça a Apple Boutique: A boutique psicodélica dos Beatles em Londres

Deixe um comentário