A cidade é São Paulo e a década é a de 1970. Depois de uma semana exaustiva de trabalho e estudos, chega a noite de sexta-feira, período este muito aguardado entre os jovens negros. Neste dia eles se reúnem na porta do Mappin (ou no Viaduto do Chá, alguns anos depois) para saber as novidades da próxima edição de um baile altamente badalado entre a cultura black.
No sábado, os salões de beleza paulistanos especializados em cuidar e manter os penteados black power são tomados por clientes durante o dia. Enquanto isso, à noite, os ônibus lotam de jovens com o penteado citado acima, calças boca de sino e mocassins de bico fino. O ponto de descida é o mesmo entre todos estes passageiros – a parada mais próxima o possível do local onde é realizado o tal baile anunciado no dia anterior, o Chic Show.
Este evento, que recentemente ganhou um documentário na Globoplay, era muito mais que um simples baile. Era um espaço onde os negros podiam extravasar, ser eles mesmos e “serem gente”, como disse a entrevistada de uma reportagem feita na época e que teve um trecho seu exibido no recente documentário.
Anos 70 – início e ascensão
O Chic Show foi fundado no ano de 1970 pelo então adolescente Luiz Alberto da Silva, o Luizão. Ele era apaixonado por música e preferia gastar em discos, ao invés de roupas e outras coisas de interesse dos jovens da época. Essa festa pode não ter sido a pioneira no geral, mas foi em termos de tamanho, infraestrutura e popularidade, visto que suas antecessoras eram menores, marginalizadas pela sociedade e com instalações precárias.
Apesar de sua entrada acessível, ir ao evento era como se estivesse indo para uma premiação de Hollywood. Tinha toda aquela energia de “tapete vermelho”, com todos os seus frequentadores esbanjando seus looks “bafônicos” do momento. Ainda, o evento se tornou mais badalado e os negros ganharam mais representatividade depois que, ainda no início dos anos 70, migraram do pequeno espaço na Barra Funda (onde hoje é a Blue Space) para o estádio do Palmeiras, que até então era frequentado apenas pela elite branca brasileira.
Depois de conquistarem o tal espaço com muita luta, as discotecagens passaram a dividir o palco com shows de nomes famosos da cultura black, como Jorge Ben Jor, Gilberto Gil, Sandra de Sá e Tim Maia. Lá pelo ano de 1978, vieram as atrações internacionais, sendo a primeira delas James Brown, e a Chic Show se viu crescendo ainda mais, alcançando mais de 15 mil frequentadores e tomando os muros de São Paulo com lambe-lambes.
Anos 80 e 90 – transformações, chegada de novos gêneros e um programa de rádio
Já os anos 80 foram uma década de transformações para o Chic Show. Para começar, o baile se espalhou não apenas pela cidade, como também pelo estado de São Paulo. Isso permitiu que o evento acontecesse em mais de um lugar ao mesmo tempo. Além disso, a edição principal do baile voltou para a Barra Funda e ganhou um espaço maior e com direito a camarote, chamado Clube da Cidade. E, por fim, quase na virada para os anos 90, sua discotecagem foi atualizada para o hip hop e o pagode.
Quanto ao seu repertório de pagode, foi no Chic Show que nomes famosos do gênero foram descobertos, entre eles os grupos Katinguelê e Sensação. Com essa pegada mais romântica vinda dos grupos de pagode, pop e da agora antiga soul music, o baile ganhou um programa de rádio na Band FM chamado Black in Love, comandado pelo próprio Luizão.
Por algum motivo não divulgado pela mídia, o Chic Show deixou de fazer seus grandes bailes em 1996. O programa Black in Love ainda segue firme, mas não mais na Band e, sim, no Youtube e em estações alternativas de web rádio. O próprio Chic Show também tem a sua estação homônima de web rádio, com músicas black dos anos 70 até as atuais. O Luizão, que atualmente comanda o programa e a estação de rádio, uma vez ou outra promove bailes da Chic Show, mas nada supera as edições antigas dos anos 70 a 90.
